SISTEMAS DE PRODUÇÃO DE MILHO SAFRINHA EM MATO GROSSO DO SUL

 

Gessi Ceccon
Angelo Cesar Ajala Ximenes

 

1. Introdução

 

Mato Grosso do Sul (MS) está localizado entre as latitudes 17º35’ e 23º58’ Sul e as longitudes 51º03’ e 57º53’ Oeste, com altitude média de 368 m.

 

Em MS, na safra verão de 2007 a soja foi cultivada em 1.718.031 ha e o milho em 99.497 ha. No outono-inverno foram cultivados 31.843 ha com trigo, 15.789 ha com aveia branca, 70.792 ha com sorgo granífero, 8.319 ha com girassol e 771.717 ha com milho safrinha. As culturas econômicas cultivadas no outono-inverno ocuparam apenas 49,7% da área cultivada com soja e milho no verão.  Considerando a área cultivada no outono-inverno, o milho safrinha ocupou 86% da área, com aumento significativo quando comparado com os anos anteriores, no entanto com rendimento de grãos de apenas 3.232 kg ha-1 (Levantamento..., 2007).

 

Estima-se que as demais lavouras tenham sido cultivadas com aveia preta e nabo ou permaneceram em pousio, devido à estiagem ocorrida no ano que inviabilizou a semeadura tardia. O maior percentual de área cultivada no outono-inverno, em relação à área de soja e milho no verão, continua sendo de 51 %, em 2003 (Levantamento..., 2007).

 

A sucessão de culturas com soja no verão e, milho safrinha, trigo e aveia no outono-inverno são predominantes. Essa sucessão é interrompida em pequenas áreas, por alguns agricultores mais tecnificados.

 

O principal sistema de produção de palha e grãos na safrinha é o consórcio de milho safrinha com B. ruziziensis, predominando a implantação da B. ruziziensis na entre-linha do milho ou em linhas de 0,20 m, com o milho em espaçamento de 0,80 m entre linhas (Ceccon, 2007).

 

O milho safrinha é cultivado em pequenas, médias e grandes propriedades, onde o nível de investimento (adubação, tratamento de sementes, controle de plantas daninhas e pragas) varia com o nível tecnológico do agricultor e com a época de semeadura, sendo maior nas semeaduras precoces e por agricultores com maior poder aquisitivo. E, os insumos constituem a maior parte do custo de produção, responsáveis pelo aumento no custo total (Richetti, 2007).

 

            O levantamento sistemático realizado por Richetti (2007), com profissionais da assistência técnica, visando estimar o custo de produção das principais culturas, fornece subsídios para avaliar o nível de tecnologia adotado pelos agricultores. Para melhor entender essas tecnologias, foram realizadas também, visitas em propriedades, com agricultores das principais regiões produtoras de milho safrinha (Ceccon, 2007).

 

Foram diagnosticadas 64 lavouras, durante o mês de julho de 2007, entre os municípios de Itaquiraí, Naviraí, Ponta Porã, Dourados, Maracaju, Sidrolândia, Chapadão do Sul e São Gabriel do Oeste (Ceccon, 2007). A consulta com agricultores procurou identificar os sistemas e épocas de implantação, os principais híbridos e cultivares de milho e seu destino. Em cada lavoura foi marcada uma linha de cinco metros e anotado o número de plantas com espigas. Desta linha foram coletadas cinco espigas, representativas da lavoura, trilhadas em laboratório para quantificar o rendimento de grãos. Foi anotado o espaçamento entre linhas, a porcentagem de solo coberto com palha através de nota visual de 0 a 100%, e identificando as principais espécies de plantas infestantes.

 

 

2. Implantação da lavoura

 

A implantação da lavoura de milho safrinha é realizada exclusivamente em semeadura direta, sem revolvimento do solo, visto que essa cultura foi responsável pela evolução do sistema plantio direto (SPD) em Mato Grosso do Sul. No entanto, em função da presença de plantas invasoras após a colheita do milho safrinha, alguns agricultores retornam com o preparo mecânico do solo, com grades, para implantação da soja no verão.

 

O milho safrinha é semeado imediatamente após a colheita da soja, de fevereiro a meados de março, diminuindo os riscos de perdas de lavouras pela falta de chuva (Figura 1) e baixas temperaturas que ocorrem em junho e julho (Figura 2). Alguns agricultores realizam a dessecação da soja para antecipação da colheita, mediante a aplicação de 1,0 a 1,5 L ha-1 de paraquat, entre outros produtos.

 

Em 2007, alguns agricultores semearam o milho safrinha durante o terceiro decêndio de abril, devido ao atraso na colheita da soja, e por terem as sementes de milho à disposição na propriedade.

 

Figura 1. Níveis de risco de cultivo do milho, em relação à falta de chuvas e em função da expectativa de duas produtividades de grãos, em Dourados, MS.

Fonte: Lazzarotto, (2002).

 

A semeadura tardia deve-se também à falta de estrutura que disponibilize sementes de culturas alternativas mais indicadas para cultivo nos meses de abril e maio, tais como o trigo, aveia branca e girassol. Devido ao planejamento inadequado, tanto do agricultor, quanto dos produtores de sementes e, também em função de mercado, a área com culturas alternativas não evolui em MS. Com isso, parte das lavouras cultivadas no verão permanece sem o cultivo de uma cultura de retorno econômico, ou mesmo para cobertura de solo, no outono-inverno.

 

Figura 2. Distribuição de chuva e temperaturas máximas e mínimas decendiais, durante o cultivo do milho safrinha, em Dourados, MS, 2007.

Fonte: http://www.cpao.embrapa.br/servicos/estacao(consulta em 11/10/2007).

 

A maioria dos agricultores utiliza três híbridos ou mais por safra em suas lavouras, com predominância de híbridos simples em solos mais argilosos. Nas semeaduras de fevereiro e março, há preferência pelos híbridos de ciclo precoce e super precoce. Os híbridos duplos são utilizados em regiões de solos mais arenosos e, em alguns casos nas semeaduras tardias, sendo a escolha do híbrido bastante influenciada pela empresa comercial representante. Porém, ainda existem algumas poucas lavouras sendo implantadas com sementes de menor potencial produtivo, comumente chamadas de “milho de galpão”.

 

Em diagnóstico realizado por Ceccon (2007), em 64 lavouras de milho safrinha em MS, verificou-se que 10,9% das lavouras estavam com espaçamento entre 0,45 e 0,50 m, 7,8% das lavouras estavam com espaçamento entre 0,70 e 0,75 m, 37,5% das lavouras estavam com espaçamento de 0,80 m e, 43,8% das lavouras estavam com espaçamento entre 0,90 m.

 

A população de plantas mais utilizada está entre 47 e 52 mil plantas por hectare, com maiores populações nos menores espaçamentos entre linhas.

 

O espaçamento de 0,45 m é utilizado por agricultores que possuem plataforma específica na colhedora. A justificativa dos agricultores para redução de espaçamento é atribuída ao maior aproveitamento do adubo, em alguns casos, que cultivam com maior investimento, obtém maior produtividade e, pelo maior controle de plantas daninhas.

 

As sementes de milho safrinha semeadas em fevereiro e março recebem tratamento químico, na maioria das vezes com thiametoxan, imidacloprid ou tidicarb, nas doses indicadas pelos assistentes técnicos ou representantes comerciais.

 

 

3. Solos e Adubação

O milho safrinha predomina em solos com elevados teores de argila. No entanto, a cultura tem evoluído e vem sendo cultivada também em solos com baixos teores de argila, como nos municípios de Naviraí e Iguatemi, ao Sul, e em Chapadão do Sul, localizado ao Nordeste do Estado.

 

Com exceção de algumas lavouras na região de Maracaju (Richetti & Melo Filho, 2004), as adubações são realizadas exclusivamente na semeadura, com doses entre 100 a 300 kg ha-1 das fórmulas 8-20-20, 10-20-20, 12-15-15, entre outras. As doses são utilizadas em função da análise do solo, da época de semeadura e também da capacidade financeira do agricultor. As menores doses são verificadas, principalmente, em pequenas propriedades, que possuem solos argilosos e de maior fertilidade natural.

 

 

4.  Controle de Plantas Daninhas

A dessecação é realizada quando existem plantas daninhas remanescentes da soja, utilizando herbicida glyphosate, na dose de 1,5 a 2,5 L ha-1. Não obstante, é adicionado um inseticida para controle de insetos sobreviventes da soja, como os percevejos da parte aérea.

 

Durante o cultivo do milho safrinha, as principais espécies de plantas daninhas encontradas são: capim colchão (Digitaria spp.), capim carrapinho (Cencrhus echinatus), picão preto (Bidens pilosa), corda de viola (Ipomoea purpurea), caruru (Amaranthus sp) e trapoeraba (Commelina sp), entre outras de menor importância.

 

O controle das plantas daninhas é realizado mediante a aplicação de atrazine, na dose de 2,5 a 3,0  L ha-1. O herbicida 2,4-D também é utilizado na dose de 0,2 a 0,4 L ha-1. Em algumas situações específicas é utilizado o herbicida nicosulfuron (Sanson) na dose de 0,30 a 0,5 L ha-1, sendo que nas lavouras de menor investimento, o controle de plantas daninhas nem sempre é realizado, o que facilita a multiplicação dessas plantas.

 

A cobertura do solo, que poderia ser uma opção para diminuir a germinação de sementes de plantas daninhas, praticamente não existe, tendo sido observado cobertura média de 33% de solo em todas as lavouras, exceto onde foi realizado consórcio com Brachiaria ruziziensis, que apresentava cobertura de 70 a 90% (Ceccon, 2007).

 

 

5.  Controle de Pragas e Doenças

O percevejo castanho (Scaptocoris castanea), o coró-do-milho (Liogenys sp) e a larva alfinete (Diabrótica speciosa), são as principais pragas que vivem no solo e se alimentam das raízes do milho. O controle é realizado mediante o tratamento de sementes com inseticidas, imidacloprid,  thiametoxam e tiodicarb. Este último é eficiente também no controle de lagarta do cartucho (Spodoptera frugiperda), que juntamente com o percevejo barriga-verde (Dichelops furcatus), são as principais pragas da parte aérea do milho safrinha. O controle é realizado com duas ou três aplicações de inseticidas, utilizando um ou dois dos produtos, normalmente alternando os princípios ativos, entre eles, os mais utilizados: piretróides (Karate) (0,05 L ha-1), organofosforados (Clorpirifós) e carbamatos (Lanate), nas doses indicadas pelo fabricante.

 

Em levantamento de ocorrência e controle de pragas em MS, Waquil et al. (2004) encontraram outras pragas, como larva angorá (Astylus variegatus), percevejo-verde-da-soja (Nezara viridula), tripes e insetos vetores de doenças, como as cigarrinhas e os pulgões, entre outras pragas.

Quanto às doenças, destacam-se a pinta-branca (Phaeosphaeria maydis), a helmintosporiose (Exserohilum turcicum) e recentemente a cercosporiose (Cercospora zeae-maydis) e a podridão do colmo (Diplodia maydis).

 

            A indicação de cultivares específicas tem sido a principal estratégia de controle, visto que o milho é cultivado em sucessão com a soja. As empresas comercializadoras de sementes, que também prestam assistência técnica, têm interesse em divulgar os seus melhores genótipos. Alguns agricultores tem realizado a aplicação experimental de fungicida via foliar, principalmente por desafio técnico e pressão comercial.

 

 

6.  Colheita e Comercialização

 

Considerando que no outono-inverno a perda de umidade dos grãos é lenta, dificultando as condições de colheita, esse fator pode favorecer a quebra de colmos e tombamento de espigas. Isso interfere na produtividade e na qualidade da lavoura, trazendo maiores dificuldades para os agricultores que contratam a colheita com terceiros, pagando, em média, R$ 25,00 ha-1(Richetti & Melo Filho, 2004). Nas propriedades de médio e grande porte a colheita é realizada com máquinas próprias.

 

Os pequenos agricultores vendem o milho logo após a colheita, porém os grandes proprietários armazenam à espera de melhores preços, chegando a sobrepor uma safra sobre outra. A venda é realizada, na maioria das vezes, para fábricas de ração e criadores de aves e suínos do Estado e parte é vendida para Estados do Sul e Sudeste do Brasil.

 

Em 2007 o custo total médio estimado foi de R$ 732,06 em Dourados, R$ 772,41 em Maracaju, e R$ 725,59 em Ponta Porã, para uma produtividade de 3.000 à 4.800 kg ha-1 (Richetti 2007). Na hipótese de que o produto seja vendido ao preço de R$13,07 sc-1, seria necessário colher 3.658 kg ha-1 para o agricultor pagar o custo de produção. Nas 64 lavouras diagnosticadas por Ceccon (2007) foi encontrado rendimentos médios de 3.880 à 6.060 kg ha-1, demonstrando que é possível melhorar o desempenho da cultura em Mato Grosso do Sul.

 

 

 7. Conclusões

 

O sistema de produção de milho safrinha em MS necessita ser planejado em longo prazo, incluindo as culturas de verão e de outono-inverno, visando adequar sistemas de rotação de culturas com espécies para semeadura em abril e maio, em especial o consórcio com braquiária e outras culturas de safrinha, com manejo integrado de pragas e doenças.

 

Considerando a área cultivada com soja na safra de verão, pode-se afirmar que existe espaço para expandir a cultura do milho safrinha em Mato Grosso do Sul.

 

 

Referências

CECCON, G. Estado da arte em produção de palha no Centro-Oeste Brasileiro. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2007. Relatório do projeto de pesquisa Fundação Agrisus 362/07, 2007. Projeto de pesquisa Fundação Agrisus 362/07: relatório.

GUIMARÃES, A. V. Mato Grosso do Sul, sua evolução histórica. Campo Grande, MS: UCDB, 1999. 283 p.

LAZZAROTTO, C. Época de semeadura e riscos climáticos para o milho da safra outono-inverno, no Sul de Mato Grosso do Sul. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2002. 4 p. (Embrapa Agropecuária Oeste. Comunicado técnico, 70).

LEVANTAMENTO Sistemático da Produção Agrícola. Campo Grande, MS: IBGE, Unidade Estadual-MS, 1987-2005.

LEVANTAMENTO SISTEMÁTICO DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA. [Rio de Janeiro]: IBGE, 2007. Disponível em: <www.sidra.ibge.gov.br>. Acesso em: 31 set. 2007.

RICHETTI, A. Estimativa de custo de produção de milho safrinha para 2007, em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2007. 9 p. (Embrapa Agropecuária Oeste. Comunicado técnico, 128).

RICHETTI, A.; MELO FILHO, G. A. de. Estimativa de custo de produção de milho 2ª safra, 2005, em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2004. 10 p. (Embrapa Agropecuária Oeste. Comunicado técnico, 94).

TOMASINI, R. G. A. Evolução histórica e aspectos econômicos. In: OSÓRIO, E. A. (Coord.). Trigo no Brasil. Campinas: Fundação Cargill, 1982. v. 1 p.1-26.

WAQUIL, J. M. et al. Ocorrência e controle de pragas na cultura do milho no Mato Grosso do Sul – safrinha. Sete Lagoas: Embrapa Milho e Sorgo; Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2004. (Embrapa Milho e Sorgo. Circular técnica, 46).


Gessi Ceccon é Pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, BR 163, km 253,6, Caixa postal 661, CEP 79.804-970, Dourados, MS.

Contato: ceccon@cpao.embrapa.br


Angelo Cesar Ajala Ximenes  é Engenheiro Agrônomo, MSc. Presidente da Associação dos Engenheiros Agrônomos da Grande Dourados – AEAGRAN, Dourados, MS.
Contato: E-mail: coperplan@terra.com.br



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

CECCON, G.; XIMENES, A.C.A. Sistemas de produção de milho safrinha em Mato Grosso do Sul. 2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2006_3/SisSafrinha/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 11/10/2006      Atualizado em 08/05/2008