Como minimizar o estresse hídrico na soja


por Luiz Alberto Staut

 

A água é fator fundamental na produção vegetal. Sua falta ou seu excesso afeta de maneira decisiva o desenvolvimento das plantas. Qualquer cultura utiliza grande volume de água, durante o seu desenvolvimento, e grande parte deste somente passa pela planta e perde-se, posteriormente, para a atmosfera pelo processo de transpiração.
 

As relações planta-água de qualquer cultura agrícola são bastante complexas, envolvendo aspetos de fisiologia vegetal, física de solo, agrometeorologia e agronomia em geral. Porém, os dois fatores mais importantes para o bom desenvolvimento vegetal são: a existência de água disponível no solo para as plantas e a distribuição radicular da cultura ao longo do perfil do solo.
 

A quantidade de água disponível no solo para as plantas esta intimamente ligada à quantidade e distribuição das chuvas e das propriedades do solo no que se refere à retenção de água. Em Dourados, segundo dados da estação meteorológica da Embrapa Agropecuária Oeste, nos últimos três anos a média de precipitação foi de 1.300 mm/ano, quantidade suficiente para o desenvolvimento das culturas durante o ano. No entanto, a distribuição das chuvas tornou-se ultimamente um sério problema. Nesta região, era comum a ocorrência de veranicos de uma semana a dez dias, mas nos últimos anos estes têm ocorrido de forma mais prolongada e se configurando não mais como veranicos, mas sim como estiagem.
 

Como exemplo, tem-se que em janeiro/fevereiro de 2004; fevereiro/março de 2005 e janeiro de 2006 foram registrados de 35, 31 e 16 dias sem chuva, respectivamente. A produtividade das culturas em geral e principalmente da soja, que nesta época se encontrava na fase de formação/enchimento de grãos, foi afetada de forma irreversível. Esta queda na produtividade pode ser atribuída à baixa capacidade de retenção de água no solo na camada de 0 a 20 cm, que nos solos argilosos é em torno de 25 mm e nos de textura média a arenosos este valor situa-se próximo de 15 mm. Considerando que a evaporação média é em torno de 5 mm dia, teoricamente ter-se-ia água armazenada para somente um período de três a  cinco dias. Porém, o que se verifica na prática é que a soja tem a capacidade de suportar em até 30% a mais este limite, o que corresponde de oito a dez dias de seca sem danos à produtividade.
 

Assim sendo, garantir o bom desenvolvimento das raízes e, conseqüentemente, aumentar a profundidade de exploração do solo pelas mesmas é importante na medida em que se tem, por exemplo, uma cultura que se desenvolve em um solo arenoso e que explore a camada de 0 a 20 cm e com possibilidade de estar sendo prejudicada pela falta de água depois de mais um menos oito dias sem chuvas. Se a mesma cultura explorasse a camada de 0 a 40 cm, ela ainda suportaria o dobro de dias sem chuvas.
 

A baixa capacidade de retenção de água dos solos pode ser melhorada em condições de agricultura extensiva, na medida em que se adote sistemas melhorados de cultivos, a exemplo do Plantio Direto. Neste sistema, o solo está sempre coberto por palha, o que contribui para a diminuição da evaporação e da temperatura do solo e, ao mesmo tempo, ocorre aumento na matéria orgânica favorecendo o armazenamento de água no solo.
 

Por outro lado, deve-se considerar que a quantidade de água retida no solo é tanto maior quanto mais profunda a camada considerada. Assim, uma forma de aumentar a disponibilidade de água para as plantas é procurar conduzir o sistema radicular para estas camadas. Para um bom desenvolvimento e aprofundamento das raízes, é preciso que o solo não tenha impedimentos físicos e ou químicos que dificultem o crescimento em profundidade.
 

 Para solucionar tais problemas pode-se lançar mão de diferentes procedimentos ou práticas. Nesse sentido, a subsolagem, para o impedimento físico, aliado à fosfatagem, à calagem e à gessagem, quando feitas corretamente no que diz respeito à profundidade de trabalho, incorporação e doses adequadas, tem efeitos positivos no aprofundamento do sistema radicular.
 

Para que a subsolagem seja eficiente é necessário identificar a que profundidade encontra-se a camada compactada e ajustar o subsolador e a potência do trator para um bom trabalho na descompactação. Às vezes por não ter o equipamento adequado para atingir a profundidade ideal, uma vez que o trator não tem potência para trabalhar na profundidade necessária, tende-se a trabalhar o solo mais superficialmente, não atacando diretamente o problema e, conseqüentemente, não se tem o beneficio esperado no desenvolvimento de raízes.
 

A compactação também é responsável pela subutilização dos fertilizantes pelas plantas. Trabalhos realizados para avaliar a absorção de nutrientes pelas raízes em diferentes níveis de compactação evidenciaram que, na medida que a densidade aumentou de 1,03  g cm-3 (ausência de compactação) para 1,72 g cm-3 (extremamente compactado), a absorção de nitrogênio, fósforo potássio, cálcio e magnésio diminuíram em torno de 45%.
 

O produtor, visando garantir a produtividade, investe ao redor de 20% do custo de produção no item adubação. Porém, em muitos casos, por problemas de compactação do solo, as raízes terão seu desenvolvimento comprometido e conseqüentemente a absorção de água e nutrientes pela planta estará comprometida. Com certeza os investimentos em fertilizantes não trarão o retorno esperado. Nestes casos, o que ocorre é somente a majoração nos custos de produção, já que o aumento em produtividade não se concretiza.
 

Com relação à calagem, deve-se atentar para a distribuição, procurando fazer com que esta seja a mais uniforme possível, isto é, evitar a sobreposição das faixas de distribuição, pois a ação neutralizadora do calcário sobre o solo se propaga a pequenas distâncias, tanto no sentido vertical como no horizontal. Quando a distribuição for desuniforme sobre a superfície do solo, a incorporação não corrigirá este defeito. Este problema agrava-se na medida em que a incorporação for também deficiente.
 

Os cuidados na incorporação devem ser no sentido de que a dose a ser aplicada é calculada para ser incorporada à profundidade de 20 cm. Portanto, deve-se utilizar os arados de discos ou, quando a profundidade for maior, lançar mão do arado de aivecas.  Com incorporações rasas, com grades, pode ocorrer o que se denomina de supercalagem, uma vez que a quantidade que teria que ser incorporada a 20 cm efetivamente é feita em menor profundidade, elevando em muito o pH dessa camada e conseqüentemente diminuindo a absorção dos nutrientes, ocorrendo a deficiência de macro e micronutrientes. Além disso, a calagem em excesso superficial resseca o solo, tornando as plantas mais vulneráveis ao veranico, limitando o desenvolvimento de raízes, com reflexos na produção.
 

Além do calcário, o gesso agrícola constitui uma importante fonte no fornecimento de cálcio e enxofre às plantas. Este elemento é de importância fundamental ao desenvolvimento das raízes, uma vez que as plantas necessitam de cálcio no próprio ambiente de absorção de água e nutrientes (solo) para a sua sobrevivência. Isto porque as plantas não translocam o elemento, pelo floema até as raízes. Deve-se registrar que o gesso não apresenta efeito corretivo da acidez, o seu uso melhora somente o ambiente radicular da planta e deve ser feito com base no conhecimento das características químicas e físicas do solo.
 

A dose de gesso a ser utilizada está relacionada com o teor de argila do solo, sendo que para solos arenosos, com teor de argila menor que 150 g kg-1 a dose é de 0,5 t ha-1; com o teor variando de 150 a 350 g kg-1 a dose será de 1,0 t ha-1, para os argilosos com teores de argila entre 360 e 600 e maior que 600 g kg-1 sugere-se doses de 1,5 e 2,0 t ha-1, respectivamente. Se o objetivo for apenas como fonte de enxofre utilizar 0,2 t ha-1.
 

A ocorrência de períodos de seca, que de uma maneira ou de outra causa impactos diferenciados na produtividade da soja, evidencia cada vez mais a necessidade de um sistema radicular mais profundo na tentativa de diminuir os riscos da produção agrícola. Portanto, a adoção das práticas agrícolas mencionadas anteriormente poderá ter como resultado sistemas radiculares mais desenvolvidos e mais eficientes em buscar água em profundidade no solo.


* Artigo também publicado no site Portal do Agronegócio: www.portaldoagronegocio.com.br


Luiz Alberto Staut É pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Oeste, Dourados-MS, possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (1982) e mestrado em Agronomia (Produção Vegetal) [Jaboticabal] pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1996).
Contato:
staut@cpao.embrapa.br

Agropecuária Oeste

 


Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

STAUT, L.A. Como minimizar o estresse hídrico na soja. 2006. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2006_3/soja/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 13/11/2006