Doenças causadas por fitonematóides na cultura do maracujazeiro na região centro-oeste paulista e medidas para o manejo

 

Maria José De Marchi Garcia
Ivan Herman Fischer
Aparecida Marques de Almeida
César Júnior Bueno

 

O maracujazeiro é uma planta tropical com ampla variabilidade genética. A família Passifloraceae é composta por 18 gêneros e 630 espécies, sendo o gênero Passiflora o mais importante economicamente. A espécie mais cultivada é a Passiflora edulis Sims. f. flavicarpa Deg., conhecida por maracujá-amarelo ou maracujá-azedo seguida pela espécie Passiflora alata Curtis ou maracujá-doce.
 

A partir dos anos 70, o cultivo do maracujá-amarelo cresceu no Brasil devido instalação de unidades processadoras de frutas para suco e dos bons preços pagos pelas indústrias aos produtores diante de um aumento na demanda do mercado internacional e nacional por sucos e frutas in natura (Cacex, 1987; Roncato et al., 2004). Na região centro-oeste paulista, a cultura do maracujá-amarelo também vem se destacando. Apenas na região de Bauru há mais de 60 produtores explorando essa cultura.
 

A expansão da área plantada do maracujazeiro fez-se acompanhada do surgimento e agravamento de um grande número de doenças. Estes problemas fitossanitários têm reduzido o tempo de exploração econômica da cultura e até mesmo inviabilizado o seu cultivo em determinadas regiões do estado. De cultura perene, a mesma passou a sofrer renovação constante, em algumas situações, quase que anual (Portal do Agronegócio, 2006). Sintonizados com este problema, pesquisadores (APTA - Pólo Regional Centro-Oeste/UPD de Bauru), professores (UNESP e USC de Bauru) e técnicos (SAI-Sebrae e Sagra) da região centro-oeste paulista vêm acompanhando e auxiliando o sistema de produção, do campo a comercialização do maracujá. Projetos de pesquisa financiados pela FAPESP e CNPq têm proporcionado apoio financeiro à Bauru-Frutas (Associação de Fruticultores de Bauru e Região) para aquisição de um viveiro de mudas de maracujá e máquinas de seleção e processamento de frutos, estimulando ainda mais a cultura na região. A viabilidade econômica da cultura, em pequenas propriedades rurais, depende da exploração da safra por um longo período (8 meses), fato possível somente com culturas livres de problemas fitossanitários.
 

As principais doenças causadas por fungos, bactérias e vírus na cultura do maracujazeiro na região centro-oeste paulista já foram descritas em artigo anterior intitulado “Principais doenças do maracujazeiro na região Centro-Oeste Paulista e medidas de manejo preconizadas”, publicado nesta homepage, em 06/07/2007. No entanto, doenças na cultura também podem ser causadas por outros microrganismos, tais como nematóides e fitoplasmas, além de agentes abióticos (deriva de herbicidas, adubações irregulares, etc). Neste artigo, o foco será os fitonematóides.
 

Segundo Pio-Ribeiro & Mariano (1997), na cultura do maracujá, há descritos os seguintes fitonematóides: Meloidogyne incognita (kofoid & White) Chitwood, Meloidogyne arenaria (Neal) Chitwood, Meloidogyne javanica (Treub) Chitwood, Rotylenchulus reniformis Linford & Oliveira, Scutellonema sp., Helicotylenchus sp. e Pratylenchus sp. Destes nematóides, Meloidogyne spp. e Rotylenchulus reniformis são os mais importantes, fato também constatado na região centro-oeste paulista.

 

Meloidogyne spp.

 

O Meloidogyne é considerado um dos mais importantes nematóides fitoparasitas. Ao invadir raízes de plantas, como as do maracujá, este fitoparasita induz a formação de sítios de alimentação conhecidos por galhas (Fig. 1). A galha é um engrossamento, de diâmetro variável, quase sempre observada nas raízes infestadas, sendo uma permanente fonte de nutriente para o desenvolvimento e reprodução deste fitonematóide. De uma maneira geral, em função das galhas, ocorrem sintomas reflexos na parte aérea das plantas, tais como: nanismo, amarelecimento generalizado, murcha, internódios curtos, frutos pequenos e queda de botões florais (Klein et al., 1984). A ocorrência deste fitonematóide na cultura pode implicar na queda da produtividade.

 

Figura 1. Presença de galhas nas raízes de maracujá-amarelo (Passiflora edulis Sims. f. flavicarpa Deg), variedade Afruvec, causadas por Meloidogyne incognita raça 3.

(Fonte: Garcia, M.J.M.)

 

Rotylenchulus reniformis

 

Essa espécie de fitonematóide causa danos significativos em diversas culturas, dentre as quais está o maracujazeiro. As raízes são infectadas pelos juvenis femininos e, a partir da formação de células de alimentação, a parte posterior do seu corpo, que fica fora da raiz, adquire grande volume, lembrando o formato de um “rim”. Esse formato auxiliou na denominação do nematóide Rotylenchulus reniformis.
 

Segundo Ferraz & Monteiro (1995), este nematóide não forma galhas. O sistema radicular infestado não se aprofunda no solo, tornando-se raso, deformado e pouco desenvolvido. Camada de solo pode ser observada junto às massas de ovos externas (Fig. 2), formadas pelas fêmeas, nas radicelas infestadas do maracujazeiro. Plantas doentes estão distribuídas no campo na forma de reboleira. Em algodoeiro este fitonematóide causa sintomas reflexos na parte aérea das plantas, tais como: clorose internerval nas folhas, “folha carijó”, murcha e nanismo (Fig. 2). Já em maracujá, estudos em condições de campo a cerca dos danos decorrentes de infestações por R. reniformis são escassos.

 

Figura 2. A - Plantas de algodoeiro doentes distribuídas na forma de reboleira; B - Sintoma reflexo conhecido por “folha carijó”; C - Fotomicrografia de uma fêmea com a região anterior introduzida no cilindro central e a porção dilatada do corpo externa à raiz na forma de um “rim”; D - Massa de ovos colorida na raiz com fuccina ácida.

(Fontes: Figura 2A, C, D - Soares et al. e Figura 2B – Cia & Salgado)

 

Medidas de manejo

 

O manejo de doenças consiste na adoção conjunta de várias medidas e princípios voltados para o patógeno (fitonematóide), hospedeiro (plantas) e o ambiente, visando o convívio com as doenças em níveis aceitáveis de dano e, ainda, preservando o meio ambiente.
 

As medidas preventivas são as mais indicadas para estes microrganismos. Dentre elas, podemos citar: levantamento do histórico das áreas, incluindo cultivos anteriores, tipo de solo e topografia; realização de amostragens de solo em diferentes profundidades para analise nematológica e verificação da qualidade da água utilizada na irrigação de plantas.
 

Recomenda-se plantio de mudas sadias em áreas não infestadas por estes nematóides.
 

Rotação de cultura deve ser preconizada com planta não hospedeira, antagônica ou não suscetível aos nematóides.
 

Deve sempre evitar áreas com histórico de ocorrência destes fitonematóides ou com culturas supostamente infestadas.
 

Mudas infestadas no campo devem ser eliminadas e queimadas.
 

Áreas infestadas, antes de efetuar o plantio, devem ser bem aradas com o intuito de trazer para a superfície, expondo a luz do sol, camadas profundas e restos culturais infestados. Aliado a isto, plantas daninhas também devem ser controladas, uma vez que as mesmas podem servir como hospedeiras secundárias para estes fitonematóides.
 

A medida de controle mais eficiente é o uso de variedades resistentes. No entanto, para a cultura do maracujá, as informações de comportamento de variedades frente a ação destes fitonematóides são bastante escassas. Outro fato curioso é que em algumas culturas, como no caso do algodoeiro, a influência de nematóides, principalmente Meloidogyne sp., na expressão da murcha de Fusarium, causada por Fusarium oxysporum f.sp. vasinfectum, é tão profunda que o controle de ambos os patógenos deve ser simultâneo, mesmo que se cultivem variedades resistentes. O efeito do nematóide não é o de simplesmente facilitar a penetração do fungo via ferimentos nas raízes, mas também o de predispor fisiologicamente o hospedeiro. Na cultura do maracujazeiro não se conhece a interação nematóides versus fungos de solo. Esse prévio conhecimento pode auxiliar na maneira de selecionar novos materiais de maracujazeiro. Sintonizados com isto, pesquisadores da APTA/DDD/PRDTA Centro Oeste – UPD de Bauru e um da APTA/DDD/PRDTA Extremo Oeste – UPD de Araçatuba estão começando a desenvolver um projeto de pesquisa com o intuito de verificar o comportamento de duas variedades de maracujá-amarelo frente a ação do fitonematóide Meloidogyne incognita, do fungo Fusarium solani e da interação de ambos.
 

A utilização de nematicidas na cultura do maracujazeiro necessita ainda de maiores estudos quanto a sua eficiência no controle, relação custo/benefício e fitotoxicidade ou não às plantas. Na cultura do algodão há relato de três nematicidas disponíveis (aldicarb, carbofuran e terbufós) para o controle de Meloidogyne spp. e de R. reniformis, todos de natureza sistêmica.
 

O uso de matéria orgânica proveniente de plantas não-hospedeiras, antagônicas ou supressivas é almejado, devido a sua ação nematicida combinada com melhorias do solo quanto a característica físico-química, fertilidade e no aumento do teor de matéria orgânica. Estudos devem ser feitos ainda com o objetivo de verificar os seguintes itens: a) quantidade a ser incorporada; b) quais plantas devem ser utilizadas e se há especificidade de controle ou se tem caráter de amplo espectro; c) partes da planta que possuem atividade nematicida; entre outros.
 

O controle biológico com uso de fungos ou bactérias também é promissor. No entanto, ainda carece de mais estudos quanto a eficiência e especificidade na cultura do maracujazeiro.

 

Bibliografias consultadas

 

Cacex/Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil. Notícias. Revista Informação Semanal, n.22, p.23-24, 1987.

Ferraz, L.C.C.B. & Monteiro, A.R. Nematóides.  In: Bergamin Filho, A.; Kimati, H.; Amorim, L. (Ed.). Manual de fitopatologia. 3.ed. São Paulo: Agronômica Ceres, 1995. p.168-201. V.1: Princípios e conceitos.

Pio-Ribeiro, G. & Mariano, R.L.R. Doenças do maracujazeiro. In: Kimati, H. et al. (Ed.).  Manual de fitopatologia. 3.ed. São Paulo: Agronômica Ceres, 1995. p.525-534. V.2: Doenças das plantas cultivadas.

Portal do Agronegócio. Definhamento Precoce do Maracujazeiro na Bahia e a Pinta Verde do Maracujá. Disponível em: http://www.portaldoagronegocio.com.br/index.php?p=texto&&idT=753. Acesso em 09 maio de 2007.

Roncatto, G.; Oliveira, J. C.; Ruggiero, C.; Nogueira Filho, G. C.; Centurion, M. A. P. C.; Ferreira, F. R. Comportamento de maracujazeiros (Passiflora spp.) quanto à morte prematura. Revista Brasileira de Fruticultura, v.26, n.3, p.552-554, 2004.

Soares, P.L.M.; Santos, J.M.; Lehman, P.S.  Estudo morfométrico comparativo de populações de Rotylenchulus reniformis (Nemata: Rotylenchulinae) do Brasil. Fitopatologia Brasileira, Brasília, v.28, n.3, p. 292-297, 2003.

 


Maria José De Marchi Garcia, Ivan Herman Fischer e Aparecida Marques de Almeida são pesquisadores científicos da APTA/DDD/PRDTA Centro-Oeste – UPD de Bauru
César Júnior Bueno é p
esquisador científico da APTA/DDD/PRDTA Extremo-Oeste – UPD de Araçatuba.



Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

GARCIA, M.J.M; FISCHER, I.H.; ALMEIDA, A.M.; BUENO, C.J. Doenças causadas por fitonematóides na cultura do maracujazeiro na região centro-oeste paulista e medidas para o manejo. 2007. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007_3/maracujazeiro/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 19/09/2007

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