FATORES QUE AFETAM A MATURAÇÃO E QUALIDADE FISIOLÓGICA DAS SEMENTES DE SOJA (Glycine max L.)

por André Luiz de Souza Lacerda

1 - INTRODUÇÃO

            A baixa qualidade das sementes de soja ocasiona, severos problemas para comercialização das mesmas, principalmente para os produtores de sementes certificadas. O insucesso na produção dessas sementes, e a não disponibilidade de cultivares mais produtivos, têm tornado altos os custos de produção da soja, nas novas regiões de plantio.

Considerando que os campos de produção de sementes exigem maior cuidado no controle de ervas, pureza varietal e insetos, a eliminação de lotes por problemas de germinação causa prejuízos econômicos ao produtor. O uso de sementes de baixa qualidade pelo agricultor, invariavelmente impede o estabelecimento de adequada população de plantas e exige a realização de outra semeadura.

Sabe-se que, após a maturação fisiológica, a semente pode ser considerada como armazenada em campo, enquanto a colheita não se processa. Se as condições climáticas forem favoráveis desde a maturação fisiológica até a época normal de colheita, os problemas de deterioração serão bastante amenizados. Entretanto, se no período de maturação, ocorreram índices elevados de precipitações pluviométricas, flutuações de umidade relativa do ar, variações da temperatura ambiental, resultarão, com certeza, grandes perdas na qualidade fisiológica e patológica da semente produzida. O ataque de percevejos, é outro fator que, juntamente com danos mecânicos na colheita, vem contribuindo significativamente para um acentuado descarte de lotes de sementes (COSTA et al, 1982).


2 - REVISSÃO BIBLIOGRÁFICA
 

Com exceção da região Sul e de algumas microrregiões, as demais áreas de produção de soja, são pouco adequadas à produção de sementes de alta qualidade fisiológica. O Estado do Paraná, com uma área cultivada de 2,5 milhões de ha, necessita de aproximadamente 5 milhões de sacas de sementes. Apesar de produzir essa quantidade de semente, anualmente são eliminados de 8,8 a 38,1% de lotes, após o beneficiamento, por apresentarem germinação inferior a 80% (ZAPPIA et al, 1980).

            SEDIYAMA et al (1979), avaliando 53 campos de soja, no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, MG, constaram que o uso de sementes de baixo poder germinativo era um dos fatores responsáveis pela desuniformidade de 49% das lavouras.

       Segundo DELOUCHE (1969), as falhas no estabelecimento de uma população de plantas, agronomicamente aceitável, podem ser decorrentes de uma série de fatores ambientais, tais como: preparo inadequado do solo, deficiência hídrica, presença de organismos patogênicos, pragas no solo, injúria química, e, talvez o mais agravante, a utilização de sementes de baixa qualidade.

            Conforme CARTER & HARTWIG (1963), a qualidade das sementes de soja é influenciada pela variedade e pelo meio ambiente durante o desenvolvimento e também pelas condições de colheita e armazenamento. A exposição das sementes a período de alta umidade após a maturação pode causar danos fisiológicos ou reduzir a sua qualidade (HOWELL et al, 1959).

            Segundo DUNLEAVY (1976), as sementes de soja antes da colheita são infectadas por vários tipos de microorganismos, cuja ocorrência tem sido associada a decréscimos na germinação. CARTER & HARTIWIG (1963) afirmam que a maior causa de baixa qualidade e sementes está associada com Phomopsis sojae (Lehman), fato que tem sido confirmado por vários pesquisadores.

 No ano agrícola 1979/80, ocorreu uma alta incidência de fungos do gênero Phomopsis, em conseqüência de elevados índices de precipitação pluviométrica durante a maturação da soja. Tal fungo, conforme constatado por HENNING & FRANÇA NETO (1980) afeta sensivelmente a germinação das sementes em condições de laboratório, fazendo com que os resultados obtidos sejam inferiores aos valores da emergência obtida a campo. Segundo os mesmos autores, a incidência de Phomopsis sp., em lotes de sementes de soja cai drasticamente durante a armazenagem; assim sendo, a sua ação negativa nos testes de germinação em laboratório, tende a cair, e, consequentemente, os valores obtidos no referido teste, tendem a subir com o passar dos meses.

            A ocorrência de outros microorganismos como Fusarium semitectum, Cercospora kikuchii, Macrophomina phaseolina e Rizoctonia solani foi verificada por DHINGRA et al (1979), em colheitas retardadas da soja.

            Outro fator que afeta a qualidade da semente é a incidência de danos por percevejos. Estudos conduzidos pelo CNPSoja mostram que infestações, a partir de um percevejo por metro de fileira, causam danos consideráveis à qualidade fisiológica da semente da soja. Nos estádios iniciais da soja, até à floração, os danos observados não chegam a prejudicar a semente; entretanto, se o ataque dos percevejos ocorrerem no desenvolvimento ou no enchimento de vagens, os prejuízos são de elevado significado, segundo trabalhos de PANIZZI et al (1979).

            A ocorrência de haste verde e retenção foliar advém de distúrbios fisiológicos produzidos por qualquer fator que interfira na formação ou enchimento das sementes, entre eles: danos por percevejo, seca na floração e no período de desenvolvimento de vagens e excesso de umidade no período de maturação da soja. A retenção foliar causa sérios prejuízos ao campo de semente uma vez que, apesar das vagens e sementes já estarem maduras, as folhas e/ou hastes permanecem verdes, dificultando a colheita (EMBRAPA- CNPSoja, 1991).

           O ponto de colheita de maturação fisiológica (R7) seria, teoricamente, o mais indicado para a colheita de sementes de soja, pois é o ponto em que se obtém a melhor qualidade. Neste estádio (R7), o teor de umidade da semente é bastante elevado (acima de 45%) e, a partir desta fase, a qualidade da semente irá decrescer como conseqüência do processo de deterioração (FRANÇA NETO, 1984).

            Á medida que a semente se aproxima e ultrapassa o estágio de maturação (R8), a sua vulnerabilidade aumenta e as causas do prejuízo à semente vão se tornando cada vez mais drásticas. A exposição a períodos longos ou curtos de alta umidade, além de afetar diretamente a qualidade, predispõe a semente ao ataque cada vez mais intenso de microorganismos (WILCOX et al, 1974) que acompanharão a mesma até o momento da germinação no campo. O conhecimento prático da maturidade fisiológica é importante, pois caracteriza o momento em que a semente se desliga fisiologicamente da planta e passa a sofrer maior influência das condições ambientais (MARCOS FILHO, 1986).

            A maturação da semente compreende uma série de alterações morfológicas, fisiológicas e funcionais, que ocorrem a partir da fertilização do óvulo, prosseguindo até o momento em que as sementes estão em condições para a colheita. Durante este processo, verificam-se alterações no peso da matéria seca, teor de umidade, tamanho, germinação e vigor das sementes, ocorrendo, também, alterações na composição química das sementes, ou seja, alterações nos teores de carboidratos, proteínas, lipídios, entre outras (DELOUCHE, 1971).

            Vários autores já estudaram o ponto de maturidade fisiológica das sementes de soja, e alguns concluíram que tal ponto só é atingido quando o teor de umidade das mesmas é de aproximadamente 50% (ANDREWS, 1966).

            Por outro lado, alguns consideram as características morfológicas das plantas para a identificação de tal estágio fisiológico, quando as plantas têm 80% de vagens amareladas e 20% de secas, com folhas amareladas (BASTIDAS et al, 1971), ou quando as vagens estão amarelando e 50% das folhas já estão amarelas (THOMAS et al, 1974; FEHR et al, 1977), ou ainda quando os ramos e vagens estão marrons e as folhas caídas (HAMMERTON, 1972).

            POTTS (1971) considera que uma semente está madura quando acumula o máximo de matéria seca. Neste ponto, admite-se que a quantidade de substâncias translocadas para semente é exatamente compensada pela quantidade consumida pela respiração (POLLOCK & ROOS, 1972).

            De acordo com POLLOCK & ROOS (1972), o “ponto de maturação fisiológica” é o ponto em que as sementes apresentam a sua melhor qualidade fisiológica, ou seja, onde elas apresentam máxima germinação e máximo vigor, e o seu grau de deterioração é mínimo.

            Um estudo com o objetivo de determinar a maturação fisiológica das sementes de soja, variedade UFV-1, em três épocas de semeadura, 10 e 30 de novembro e 20 de dezembro, e as colheitas nos estádios R4, R5, R6 , R7 e R8 , foram realizados por FRAGA et al, (1981). As características estudadas foram: o peso da matéria seca, teor de umidade, tamanho, germinação e vigor das sementes.

            Os resultados encontrados indicam que o teor de umidade aumentou do estádio R4 para o R5 , e, a partir do estádio R5 , decresceu até o estádio R8. O peso da matéria seca das sementes aumentou, até o estádio R7 , onde considerou que as sementes atingiram a maturação fisiológica. A germinação e o vigor das sementes aumentaram com o seu desenvolvimento, sendo que os maiores valores foram encontrados no estádio R8. As sementes colhidas no estádio R5 , R6 e R7 , na primeira época de semeadura, possuíam uma qualidade fisiológica inferior às sementes colhidas nestes mesmos estádios, nas segunda e terceira épocas de semeadura.

            O teor de umidade nas sementes de soja decresce durante todo o período do seu desenvolvimento (ANDREWS 1966). As sementes apresentam, inicialmente, por ocasião da sua fertilização, um teor de umidade cerca de 90%, ocorrendo em seguida uma redução a 70%, e, posteriormente, durante quase todo o período de acúmulo do peso da matéria seca, o teor de umidade diminui lentamente (BURRIS 1973).

            A qualidade da semente de soja é mais afetada pelas condições climáticas a partir do momento em que, pela primeira vez atinge teor de umidade abaixo de 25% após a maturação fisiológica (MONDRAGON & POTTS, 1974), portanto, o retardamento da colheita ocasiona a deterioração da semente.


3 - CONCLUSÃO

            As baixas qualidades das sementes de soja são afetadas pelas oscilações nas condições ambientais, tais como temperatura, umidade relativa do ar, precipitações pluviométricas e os severos ataques de pragas (percevejos) e doenças (Phomopsis sp)., após a maturação e no armazenamento.

            Para que ocorra uma produção de sementes com alta germinação e vigor, é necessário que as sementes sejam colhidas no ponto máximo de sua maturação fisiológica (R7), que na prática é muito discutido e de difícil determinação.

            Portanto, o retardamento da colheita ocasiona a deterioração das sementes. O produtor de semente não pode controlar as condições climáticas durante o período de colheita, mas algumas medidas podem ser tomadas para limitar a extensão e a severidade da deterioração da semente. Estas devem ser colhidas quando atingem a maturidade morfológica (14% a 15% de umidade ).

 

4 - REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS

 

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André Luiz de Souza Lacerda possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal de Lavras (1995), mestrado em Sistemas de Produção pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1999) e doutorado em Fitotecnia pela Universidade de São Paulo (2003). Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Matologia, Sistemas de Produção e Biotecnologia atuando principalmente nos seguintes temas: Meio Ambiente, OGM´s e Herbicidas.
Contato:
alslacer@yahoo.com.br


 

Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

LACERDA, A.L.S. Fatores que afetam a maturação e qualidade fisiológica das sementes de soja (Glycine max L.). 2007. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007_3/maturacao/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 18/07/2007

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