ALGUNS ASPECTOS SOBRE O USO DE CANA-DE-AÇÚCAR NA ALIMENTAÇÃO DE RUMINANTES

Edison Valvasori
Valdinei Tadeu Paulino

INTRODUÇÃO

A busca de alternativas de energia limpa tem nos biocombustíveis uma rica fonte natural. A cultura da cana-de-açúcar tem gerado bilhões de litros de etanol, possibilitando novos mercados consumidores. Ocupa seis milhões de hectares do território nacional e cerca de 3,1 milhões de hectares do Estado de São Paulo, com perspectivas de aumentos de área e investimentos de bilhões de reais em agroenergia. É preciso crescer e incrementar a eficiência agronômica das culturas no processo de transformação em biodiesel e etanol. Paralelamente, o crescimento dos agronegócios brasileiros será ainda mais sustentável, agregando valores, tais como o fomento concomitante da pecuária nacional, onde o Brasil figura internacionalmente como líder.

A cana-de-açúcar é amplamente utilizada por pecuaristas brasileiros. Trata-se de um volumoso de fácil cultivo, alta produtividade e com ponto de colheita que coincide com o período de escassez de pastagens. A cana-de-açúcar torna-se uma alternativa viável, economicamente, aos produtores que não dispõem de máquinas agrícolas ou de recursos necessários para produção de milho e sorgo para silagem (Lima, 2007).

A falta de conhecimento de técnicas adequadas levou, em passado recente, a cana ao descrédito pelo baixo desempenho dos animais com ela alimentados, decorrente do seu baixo conteúdo de nitrogênio e minerais. Novas tecnologias associadas a maiores produtividades agrícolas e adequado balanceamento alimentar, utilizando a cana-de-açúcar resultam em bom desempenho animal, tanto na produção de leite como de carne.

A produção animal deverá enfrentar, nos próximos anos, desafios. Esses novos desafios em termos de bem-estar, saúde animal, qualidade e segurança alimentar exigem diferenciação e valorização em termos de novos tipos de produtos especializados. Todas as outras áreas (genética, manejo, gestão empresarial e outras) deverão dar resposta aos novos desafios, será a nutrição e alimentação a que mais poderá contribuir para inovações e o desenvolvimento de soluções satisfatórias as novas exigências.

As tendências para o Estado de São Paulo evidenciam, para os próximos anos, que a genética animal será o ponto forte, destinando as áreas de pecuária para cria e terminação dos animais. A cana-de-açúcar representa uma opção alimentar de baixo custo que pode atender a exploração de animais em confinamento, com eficiência e segurança.

BALANCEANDO UMA RAÇÃO

Quando se inclui a cana-de-açúcar ou outro alimento, em qualquer uma de suas formas ou produtos, em programas de alimentação animal, devem ser levados em conta as concentrações de energia, proteína, aminoácidos, vitaminas e minerais do produto e a categoria animal, suas exigências e os objetivos a serem atingidos.

A formulação de rações balanceadas, só é possível com base na composição dos alimentos utilizados e nas reais necessidades das diversas categorias de animais. A alimentação adequada do ponto de vista econômico, o correto alojamento dos bovinos, a sua boa origem e os cuidados sanitários podem ser anulados pela má nutrição, com prejuízos à saúde, produção e reprodução.

A obtenção de bons resulta dos no arraçoamento dos bovinos depende, grandemente, da correta aplicação de conhecimentos práticos baseados em princípios teóricos:

A cana-de-açúcar apresenta níveis de 3 a 4 % de proteína bruta, 3,2 a 3,7% para matéria mineral, 26 a 36% de fibra bruta e de 53 a 68% para extrativos não nitrogenados.Os teores baixos de proteína e minerais devem ser corrigidos, quando se utiliza esta gramínea, a fim de preencher as exigências dos animais. O teor de minerais na dieta, pode ser facilmente corrigido pela suple mentação mineral e o teor de proteína utilizando-se fontes de nitrogênio protéicos (ex: soja, milho, farelo de arroz, etc) e não protéicos (ex: uréia pecuária). Esta forrageira por possuir alto teor de carboidratos prontamente fermentescíveis, seu fornecimento aliado apenas a fontes de nitrogênio não protéico, geralmente não conduz a bons resultados, havendo a necessidade de ministrar-se conjuntamente com nitrogênio protéico. Embora pobre em proteína é rica em energia (acima de 60% de NDT, quando madura) e facilmente consumida pelos animais, pelo seu sabor adocicado, devido a sacarose.

USO DE URÉIA + CANA-DE-AÇÚCAR

A uréia pode e deve ser usada para reduzir custos na alimentação dos ruminantes, porém todos os cuidados e técnicas de uso devem ser observados devido sua toxidez para os ruminantes não adaptados. Sem adaptação , a ingestão de grandes quantidades de uréia, causa intoxicação que pode progredir até a morte do animal. Doses de 40 a 50 g/100kg de peso vivo podem ser fatais para animais não acostumados ao consumo da uréia.

O teor de nitrogênio nas proteínas é de 16%, em média, daí conclui-se que o fator de conversão é de 6,25 (100:16) e como a uréia apresenta 45% de nitrogênio, isto implica que 100 gramas de uréia apresenta um equivalente protéico de 280 gramas de proteína bruta para o animal ruminante.

Algumas recomendações são importantes quando se pretende fornecer a uréia nas rações:

.                      � Limitar em até 1% de uréia, na dieta total do ruminante, com base na matéria seca;

.                      � Limitar em até 3% de uréia no concentrado, quando este for oferecido separadamente do volumoso;

.                      � Limitar em 33% de nitrogênio da uréia em relação ao nitrogênio total da dieta;

.                      Fornecer juntamente com a uréia fontes de carboidratos de fácil fermentação, para facilitar a síntese microbiana;

.                      O nitrogênio não protéico pode substituir até 33% do nitrogênio protéico da dieta dos ruminantes;

.                      O aumento da quantidade de uréia fornecida diariamente deve ser gradativo para que as bactérias capazes de utilizar amônia na síntese de proteína predominem;

.                      O período de adaptação à uréia, do ruminante, varia de 2 a 6 semanas, em função do nível e da forma de fornecimento de uréia;

.                      Após adaptação, a quantidade máxima diária de uréia fornecida ao animal e de forma eficientemente para aproveitamento no rúmen é de 40g/100kg de peso vivo.

Para que os programas de alimentação a base de cana-de-açúcar e seus derivados tenham êxito é indispensável considerar os custos de produção.

O 1o; fator a ser considerado é o custo de uma matéria prima para a alimentação animal e seu conteúdo de matéria seca a qual aporta a totalidade de energia, proteína, vitamina e minerais nos programas convencionais de alimentação. No geral, as normas de alimentação compreendem duas tabelas: uma que apresenta as necessidades do animal em relação aos diversos nutrientes; outra que inclui a composição dos vários alimentos nos mesmos princípios nutritivos. As necessidades do animal considerado são calculadas com base na primeira tabela e, em seguida, na segunda tabela, dentre os alimentos disponíveis, são escolhidos os que devem compor a ração para atender às referidas necessidades. A norma é uma indicação geral, de modo que constantes ajustamentos precisam ser feitos com base na experiência do pecuarista.

No continente americano, atualmente, a Norma do Conselho Nacional de Pesquisas (National Research Council, 2001) é a mais utilizada, sendo estabelecida em termos de matéria seca, energia, proteína, minerais e vitaminas. Esta norma é de uso rápido e prático e está apoiada em sólida e extensa base experimental.

Compor uma ração, consiste em executar a melhor adequação possível entre os componentes nutritivos e as necessidades, o que obriga a melhor adequação de energia, proteína, minerais, etc.

Na prática, as forragens são fornecidas com freqüência à vontade e o arraçoamento consiste no cálculo da quantidade e da composição dos alimentos concentrados. Para isso é preciso ter-se em consideração não somente as necessidades dos animais e da sua capacidade de ingestão, mas também as interações entre os concentrados e forrageiras, que modificam a ingestão voluntária da forragem e a eficácia da utilização da energia, com repercussão em cadeia na complementação dos concentrados.

Além disso, muitas vezes as necessidades não podem satisfazer-se, no caso de fêmeas leiteiras em início da lactação, em virtude da fraca capacidade de ingestão dos animais nesse período; dessa forma o arraçoamento deve considerar déficits toleráveis que poderão ser compensados mais tarde, no meio ou final da lactação, de modo a permitir a reconstituição das reservas mobilizadas no período inicial.

Os subprodutos fibrosos da cana de açúcar (bagaço), que podem constituir até 28% da cana integral, têm grande importância como alimento para os ruminantes. Possuem baixa digestibilidade devido a alta quantidade de lignina (20%) e combinados com seu baixo conteúdo de nitrogênio, limitam sua utilização.

A pré-digestão por meios químicos, através de bases como a soda caustica ou a cal virgem, pode melhorar o alimento, elevando a digestibilidade dos resíduos lignocelulósicos, porém deve-se levar em conta as quantidades, a mão de obra, saúde do animal e custos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cana-de-açúcar é tradicionalmente utilizada na alimentação animal. Entretanto no passado sua importância como forrageira tem sido desprestigiada pela falta de conhecimento de sua utilização no arraçoamento animal. Decorrente da importância dessa cultura para bioenergia, sua expansão abrange o território paulista e vários outros estados brasileiros, seu uso na alimentação animal, como alimento energético desponta como uma opção viável técnica e economicamente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Lima, M. L. P. 2007. Cana-de-açúcar na alimentação de bovinos. In: 3o Seminário de Inovações Tecnológicas, Nova Odessa, IZ-SP. National Research Council, 2001 Nutrient Requirements of Dairy Calle, 381p. Sansoucy, R.; Aarts, G. ; Preston , 1988. Sugarcane as feed. Proceedings of FAO Expert Consultation, Roma, vol. 72, 319.

 

Origem: Instituto de Zootecnia - www.iz.sp.gov.br


Edison Valvasori é Pesquisador Científico do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento em Nutrição e Pastagens - CPDNAP, do Instituto de Zootecnia - IZ/APTA, CP 60, CEP 13460.000, Nova Odessa -SP.
Contato: valvasori@iz.sp.gov.br

 

Valdinei Tadeu Paulino é Pesquisador Científico do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento em Nutrição e Pastagens - CPDNAP, do Instituto de Zootecnia - IZ/APTA, CP 60, CEP 13460.000, Nova Odessa -SP.
Contato:
paulino@iz.sp.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado o autor e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

VALVASSORI, E.; PAULINO, V.T. Alguns aspectos sobre o uso de cana-de-açúcar na alimentação de ruminantes. 2007. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2007_3/ruminantes/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 10/09/2007

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