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Controle de macrófitas aquáticas

Mônica Accaui Marcondes de Moura e Mello
Daniel Andrade de Siqueira Franco
Marcus Barifouse Matallo

 

Introdução

As macrófitas aquáticas são plantas que apresentam grande capacidade de adaptação e amplitude ecológica, habitando ambientes variados de águas doce, salobra e salgadas, ambientes de água estacionária e corrente. Em sua maioria, são capazes de suportar longos períodos de seca. Na Figura 1 observam-se os cinco diferentes grupos que compõem a comunidade de macrófitas aquáticas.

 

Figura 1 - Comunidade de macrófitas aquáticas
 (Modificado de Esteves, 1998¹).

Estas plantas são essenciais ao perfeito equilíbrio do ambiente aquático, sustentando um elevado número de organismos, diminuindo a turbulência das águas e, conseqüentemente, sedimentando os materiais em suspensão, principalmente naqueles pontos onde a mata ciliar foi suprimida. São também utilizadas como substrato para a desova e refúgio de vários organismos aquáticos, como peixes e insetos.

Desenvolvimento

Com a interferência humana no represamento dos corpos d´água e seu enriquecimento pela erosão do solo agricultável, além do aporte de esgotos de origem doméstica e industrial, tem ocorrido a eutrofização dos recursos hídricos. Devido a isso, há o desequilíbrio do ambiente aquático, causando a depleção da quantidade e qualidade da água dos mananciais e o comprometimento da fauna e flora associadas a eles.

Um dos sintomas deste processo é a elevada proliferação das macrófitas aquáticas, que podem impedir os múltiplos usos dos recursos hídricos como, por exemplo, geração de energia elétrica, irrigação, navegação por hidrovias, pesca e recreação.

Abaixo e nas Figuras 2 a 10 (Modificadas de Lorenzi, 2008²), se observam as principais características das espécies daninhas mais impactantes na atualidade.

Figura 3 - Candelabro-aquático
(Ceratophyllum demersum).

Figura 4 - Capim-angola (Brachiaria mutica).

Figura 5 - Tanner-grass (Brachiaria subquadripara).

Figura 6 - Aguapé
(Eichhornia crassipes).

Figura 2 - Elodea (Egeria densa).

Figura 7 - Alface d’água (Pistia stratiotes).

Figura 8 - Cataia-gigante (Polygonum lapathifolium).

Figura 9 - Capim-de-peixe (Echinochloa polystachya).

Figura 10 - Carrapatinho (Salvinia auriculata).

 

A elodea (Egeria densa) e o candelabro-aquático (Ceratophyllum demersum) são duas espécies que têm causado grande prejuízo em reservatórios de usinas hidrelétricas. A primeira é uma planta daninha medianamente freqüente que infesta mananciais de água parada como lagos, lagoas e pequenas represas, e de pequena movimentação, como os canais de drenagem. Elas se desenvolvem abundantemente em ambientes eutrofizados, sendo que o candelabro-aquático é, ainda, tolerante a flutuações do nível de água, podendo atingir vários metros de profundidade.

O capim-angola (Brachiaria mutica) é muito abundante em baixadas úmidas e de brejos, infestando canais de drenagem, beira de estradas e culturas perenes; é hospedeiro alternativo do agente causador da bruzone do arroz. Já o Tanner-grass (Brachiaria subquadripara), que também infesta lavouras cultivadas em locais úmidos como arroz irrigado e beira de canais, se ingerido por longos períodos, pode causar intoxicação severa no gado e levá-lo ao óbito em poucas semanas.

A planta daninha aquática que causa mais problemas no país é o aguapé (Eichhornia crassipes), uma espécie muito vigorosa que dobra sua área a cada 6-7 dias, quando em condições ótimas de crescimento, chegando a produzir 480 toneladas de massa verde/ha/ano. Em segundo lugar aparece a alface d’água (Pistia stratiotes), uma espécie que cobre totalmente o ambiente aquático, desenvolvendo-se rapidamente nos ambientes poluídos e provocando profundas alterações no ecossistema.

A cataia-gigante (Polygonum lapathifolium) e o capim-de-peixe (Echinochloa polystachya) crescem nas margens e leitos semi-secos de rios, lagoas e lagos; em ambientes turbulentos, desprendem-se do sedimento, formando ilhas flutuantes gigantescas, que oferecem grande perigo à navegação.

Finalmente, o carrapatinho (Salvinia auriculata), uma espécie muito freqüente em mananciais de água parada ou pouco movimentada e que, assim como a alface d’água, cobre toda a sua superfície, bloqueando a passagem de luz solar e interferindo no ambiente aquático; chega a produzir 650g de biomassa seca/m2/ano.

Como o intuito de diminuir sua abundância, as grandes biomassas de macrófitas aquáticas têm sido combatidas utilizando o controle mecânico, químico e biológico, pois ainda não há legislação específica para seu manejo em sistema aberto. No controle mecânico as plantas precisam ser coletadas, transportadas e depositadas em local adequado, o que torna o processo oneroso e com eficácia de curto prazo, pois em pouco tempo os reservatórios são novamente colonizados. A retirada manual é eficiente apenas em ambientes menores e mais rasos.

O controle químico das macrófitas aquáticas tem sido feito basicamente com o uso de herbicidas. É um método bastante empregado em todo o mundo, porém, no Brasil, o único herbicida registrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para controle de macrófitas aquáticas das espécies Egeria densa e Egeria najas, em reservatórios de hidrelétricas, é o fluridone. Outros ingredientes ativos têm sido testados experimentalmente em sistemas fechados, porém seu uso não é permitido no país.

A eficiência do controle químico varia entre aplicações e dependerá de fatores da qualidade da água como turbidez, pH, condutividade elétrica e temperatura. Nos corpos d´água de maior profundidade, como lagoas e represas, melhores resultados são obtidos com aplicações setorizadas em baixas doses, o que permite um controle das plantas daninhas mais eficiente e com menor risco para espécies não-alvo e a fauna associada.

Segundo os defensores deste método, o controle químico promove resultado rápido, com baixo investimento econômico e especificidade. Entretanto, já se observou que o glyphosate, uma das moléculas mais empregadas no mundo todo e um herbicida pós-emergente de amplo espectro e baixa persistência no ambiente (cerca de 47 dias), pode promover mutações genéticas em tilápias (Tilapia rendalli) e mudanças comportamentais em peixes como o mato-grosso (Hyphessobrycon eques) e o paulistinha (Danio rerio).

Do ponto de vista ambiental, o controle biológico é o mais recomendável, pois possibilita a incorporação da biomassa de macrófitas aquáticas por animais herbívoros, como peixes e mamíferos, que podem ser aproveitados pelo homem. No Brasil, bons resultados foram obtidos com peixes como a carpa-capim (Ctenopharyngodon idella), a tilápia (Tilapia rendalli) e o pacu (Piaractus mesopotamicus) (Figura 11).

 

Figura 11 - Espécies que podem ser empregadas
 no controle biológico de macrófitas aquáticas.
 a) Tilapia rendalli; b) Piaractus mesopotamicus
Fonte:http://www.fishbase.org/home.htm

O pacu é capaz de realizar uma taxa de controle diário (o quanto o peixe controla por dia em relação ao seu peso vivo, em porcentagem) de elodeas (Egeria densa, E. najas) e do candelabro-aquático (C. demersum) entre 09,3 e 20,0%, podendo eliminar uma massa verde dessas plantas, com a mesma quantidade de seu peso, em sete dias. Resultados semelhantes foram encontrados para a carpa-capim, com essa taxa variando entre 05 e 25%, no controle de espécies como Azolla filiculoides e Lemna sp. em canais de drenagem.

Na Argentina, o uso da carpa-capim, estocada numa taxa de 100 kg.ha-1, resultou no controle efetivo de macrófitas aquáticas submersas, após dois meses de sua introdução em canais de irrigação, sob condições naturais. A carpa comum (Cyprinus carpio) também produziu resultados satisfatórios, quando introduzida numa taxa de 500-2000 juvenis.ha-1, com a redução de uma biomassa de macrófitas entre 40-100% em canais de drenagem. Um impacto negativo desta introdução, entretanto, foi o aumento da turbidez da água, uma vez que esta espécie de peixe revolve o sedimento de fundo, em busca de alimento.

A rizipiscicultura no sul do país é um bom exemplo das vantagens do controle biológico de macrófitas. Um sistema que emprega a carpa comum, as carpas chinesas [prateada (Hypophthalmichthys molitrix), capim (C. idella) e cabeça grande (Aristichthys nobilis)] e o jundiá (Rhamdia quelen) (Figura 12), em consórcio com a rizicultura, tem suprimido/reduzido a dependência da utilização de agroquímicos na produção do arroz irrigado.

 
Figura 12 - Espécies que podem ser utilizadas em
 sistema de policultivo consorciado com a rizicultura.
 a) Carpa comum; b) Carpa prateada; c) Carpa capim;
 d) Carpa cabeça grande; e) Jundiá³.
Fonte:http://www.fishbase.org/home.htm

A piscicultura entra como atividade paralela, elevando a rentabilidade da rizicultura (os peixes substituem as máquinas no preparo do solo, reduzindo de 40% a 50% os custos de produção, e não afetam o rendimento do arroz); otimiza o uso do solo e da água, inclusive na entressafra do cereal, gerando receita em torno de R$ 3 mil/ha de espelho d’água, com uma produtividade em torno de 400kg peixe/ha. Como fatores limitantes citam-se a falta de informação para a adoção do sistema, principalmente no que diz respeito à densidade e época de estocagem dos animais, e de padronização dos tabuleiros de arroz, o que muitas vezes impede sua drenagem completa e, deste modo, a despesca total dos peixes.

Conclusão

Pelas informações aqui apresentadas, pode-se concluir que enquanto não se combaterem as fontes eutrofizadoras dos recursos hídricos, não será possível o controle efetivo das macrófitas aquáticas, que sempre terão o substrato necessário para seu desenvolvimento. A utilização de métodos biológicos no controle destas plantas daninhas certamente é o menos impactante, mas deve ser realizado de forma criteriosa, para que não se incorra em erros graves como a introdução de espécies exóticas, que muitas vezes competem por recursos com os organismos endêmicos e não têm predadores naturais. A introdução de espécies exóticas é apontada como uma das principais causas de perda da biodiversidade, juntamente com a destruição de habitats e a sobre exploração dos recursos naturais.

Bibliografia consultada

¹Esteves, F. A. Fundamentos de limnologia. 2.ed. Rio de Janeiro: Interciência - FINEP, 1998. 575p.

²Lorenzi, H. Plantas daninhas do Brasil: terrestres, aquáticas, parasitas e tóxicas. 4.ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2008. 640p.

³As imagens dos peixes apresentadas foram obtidas a partir do site: http://www.fishbase.org/home.htm.


Origem: Instituto Biológico - www.biologico.sp.gov.br


Mônica Accaui Marcondes de Moura e Mello possui graduação em Biologia pelo Instituto de Biociências - UNESP/Botucatu (1995), mestrado em Ciência Animal e Pastagens pela ESALQ/USP (1998), doutorado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Carlos (2005). Atualmente é Pesquisadora Científica do Centro Experimental Central do Instituto Biológico, Campinas-SP. Atua na área de psicultura com especificidade na produção de peixes em águas residuárias
Contato: monica_moura@biologico.sp.gov.br


Daniel Andrade de Siqueira Franco
possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1992), especialização em Doenças do Cafeeiro: Ferrugem e Antracnose pelo Centro de Investigação das Ferrugens do Cafeeiro (2001), mestrado em Agronomia (Proteção de Plantas) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1999), doutorado em Agronomia (Proteção de Plantas) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003) e curso-técnico-profissionalizante pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (1996) . Atualmente é Pesquisador Científico do Instituto Biológico. Tem experiência na área de Agronomia , com ênfase em Fitossanidade. Atuando principalmente nos seguintes temas: Atividade enzimática, biossólido, composto de lixo, controle biológico.
Contato: franco@biologico.sp.gov.br


Marcus Barifouse Matallo é g
raduado em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1979) com mestrado em Agronomia (Produção Vegetal) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1992) e doutorado em Ciencia Del Suelo pela Universidade de Cordoba, Espanha (1997). Atualmente é Pesquisador Científico do Instituto Biológico. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Matologia, atuando principalmente nos seguintes temas: manejo de plantas daninhas com ênfase no controle químico. ecotoxicologia de herbicidas e estudos sobre as interações entre doenças de plantas e o uso de herbicidas.
Contato: matallo@biologico.sp.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

MOURA, M.A.M.; FRANCO, D.A.S; MATALLO, M.B. Controle de macrófitas aquáticas. 2008. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2008_3/macrofitas/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 24/07/2008

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