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Importância de Puccinia psidii Winter para a eucaliptocultura no Estado de São Paulo

Christiane Ceriani Aparecido*

Silas Lisboa do Vale*,1

 

            O setor de florestas plantadas brasileiro desempenha importante papel no cenário sócio econômico do País, contribuindo de inúmeras formas por deter uma das maiores áreas de reflorestamento do mundo, equivalendo em 2009 a 6.310.450 de hectares, apresentando um crescimento de 2,5 % em relação ao total de 2008, com plantios constituídos pelos gêneros Pinus e Eucalyptus.  

            A área de florestas plantadas no Brasil vem crescendo de 2 a 3% ao anos para que a demanda crescente de madeira para diferentes segmentos do setor produtivo possa ser atendida.

            Até a década de 70, o eucalipto era considerado uma essência florestal praticamente livre de doenças. Porém, com a expansão das áreas de plantio para regiões quentes e úmidas, o plantio de espécies suscetíveis e a utilização dos mesmos locais para plantios sucessivos, um microclima favorável para a ocorrência de doenças foi formado.

            Inúmeros são os problemas causados, principalmente por fungos. Neste contexto, tem se destacado Puccinia psdii, agente causal da doença denominada ferrugem que, a partir da década de 90 tem sido apontada como uma das principais doenças da cultura, resultando em severos danos às plantações, com redução na produção de celulose.

            No Brasil, as primeiras evidências da ocorrência do fungo ocorreram em 1929, porém o primeiro relato e descrição foram realizados somente em 1944, no Rio de Janeiro. Atualmente, é um dos principais patógenos responsáveis por gerar resultados negativos nos reflorestamentos de eucalipto do Estado de São Paulo .

            P. psidii tem sua origem na América do Sul e, nas Américas, a doença ocorre desde o Sul dos Estados Unidos até a Argentina (Figura 01), sendo considerada  uma das doenças mais severas na cultura do eucalipto no Brasil.

Figura 01 – Distribuição geográfica de Puccinia psidii nas Américas (COELHO, 1988).

            A doença incide em viveiro e, no campo atinge plantas jovens com até 2 anos de idade, além de brotações após o corte raso, quando pode se tornar ainda mais importante pois afeta de forma severa os tufos de  brotações recém emitidas dos tocos, o que pode resultar na morte total destas brotações, ocasionando a reforma do povoamento precocemente após o primeiro corte.

            Além do eucalipto, o micro-organismo infecta os tecidos jovens de  frutíferas nativas do Brasil, como por exemplo: uvaia, araçazeiro, goiabeira, jabuticabeira e, também espécies introduzidas como jambeiro. Quanto aos sintomas da doença ocorrem, inicialmente, nos tecidos jovens de folhas e caule ainda em formação. Começam como pontuações cloróticas que se transformam em pústulas ou soros de coloração amarelo vivo. Estas pústulas podem coalescer, recobrindo a superfície das brotações do eucalipto, quando o ataque é intenso. Em consequência, os tecidos afetados morrem e secam, adquirindo coloração negra, como se fossem queimados (Figura 02). Dependendo das condições ambientais, a planta pode reagir, emitindo novas brotações.

 
   
Figura 02 – Sinais e sintomas de Puccinia psidii em diferentes mirtáceas. A – Jambeiro; B – Eucalipto; C – Goiabas; D – Uvaia.

            No País a doença constituí um sério problema, principalmente, devido à ocorrência de condições ambientais favoráveis (temperaturas amenas e umidade relativa bastante elevada) praticamente durante todo o ano e, existência de mirtáceas nativas nas plantações de eucalipto, as quais atuam como importantes fontes de inóculo. As condições ambientais são importantes para o desenvolvimento da doença porque favorecem a infecção, formação de todas as estruturas infectivas e de resistência do patógeno (teliosporos, basidiosporos e urediniosporos), além da fenologia do hospedeiro. Como resultado, a doença pode se tornar fator limitante à produção e desenvolvimento da planta infectada.

Devido à importância de P. psidii quanto aos significativos prejuízos que pode causar, em trabalho conjunto o Instituto Biológico (Centro de P & D de Sanidade Vegetal) e a FCA-UNESP, Campus de Botucatu SP, têm realizados estudos em condições controladas visando conhecer mais adequadamente o comportamento do patógenos frente a diferentes condições ambientais e, também, observações em campo, afim de que fosse verificado o comportamento do patógeno frente a diferentes hospedeiros e sob condições naturais. Para a realização das pesquisas em laboratório, é utilizado o germinatélio, que funciona como uma micro-câmara úmida. Quanto ao estudo de campo, foram realizadas observações durante 1999 e 2000, em área da Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA-UNESP), Botucatu, SP, avaliando-se a evolução dos sintomas de P. psidii em diferentes espécies de mirtáceas, registrando-se diariamente umidade relativa do ar e temperaturas mínima e máxima.

Os estudos em laboratório têm possibilitado constatar que as temperaturas mais adequadas à germinação das estruturas infectivas do patógeno variam entre 150 e 210C e quanto mais velhas, menor é a porcentagem de geminação. As observações da evolução da ferrugem em campo permitiram verificar a ocorrência dos maiores picos, sobre goiabeira, em fevereiro; sobre Eucalyptus cloeziana em março e, sobre jambeiro, E. botryodes, E. urophylla e E. grandis – procedências Itatinga e Anhembi, em abril. Durante os meses de maior severidade, a temperatura média variou entre 210 e 240C e a umidade relativa foi superior a 70%. É importante ressaltar que 1999 foi o ano durante o qual ocorreram os ataques mais severos, enquanto que durante o ano de 2000, sobre as espécies de eucalipto, a doença foi ausente.

Verifica-se, portanto, que todo o ciclo vital de P. psidii é favorecido e depende da ocorrência de temperaturas amenas, variando de 150C a 240C. Temperaturas muito elevadas são adversas ao patógeno e, caso a infecção já tenha ocorrido, induzem à formação das estruturas de resistência denominadas teliosporos. Porém, convém ressaltar que, conforme observado, sendo tais temperaturas excessivamente elevadas, menores quantidades de teliosporos se formam, além de ocorrer necrose de parte do tecido foliar e, posteriormente senescência da folha infectada. Além disso, confirma-se que a presença de outras mirtáceas nas áreas de cultivo constituem, de fato, importante fonte de inóculo para início e/ou continuidade do processo infectivo, enquanto houver condições ambientais favoráveis. Vale ressaltar que, atualmente, têm sido realizados estudos referentes à preservação das estruturas infectivas de P. psidii em laboratório. Por ser um patógeno que necessita do hospedeiro para sobreviver, as pesquisas tornam-se complicadas devido à necessidade constante da existência de plantas adequadas à inoculação e multiplicação do patógeno.  A existência de um método de preservação da viabilidade e patogenicidade do fungo poderá sanar estas dificuldades, proporcionando maior rapidez na realização das pesquisas.

O conhecimento do comportamento biológico do patógeno possibilita a adoção correta de medidas de manejo e controle, sendo que no campo, o uso de fungicidas usualmente não se apresenta como medida economicamente viável, embora estudos recentes demonstrem resultados positivos para este controle com o fungicida Tebuconazol, tanto em termos de eficiência como viabilidade econômica (MASSON, 2009). Devido à ampla variabilidade genética inter e intra-específica, a principal recomendação de controle refere-se à seleção e plantio de clones, progênies ou espécies resistentes, como: Corymbia citriodora, Eucalyptus camaldulensis, E. pellita, entre outros. Em regiões nas quais as condições ambientais são favoráveis à ferrugem, deve-se evitar o plantio de E. grandis, E. cloeziana, E. globulus, E. phaeotricha. Em viveiros e jardins clonais, o controle de infecções intensas pode ser realizado com produtos químicos. Porém, aliando-se medidas de controle ao manejo, é importante, também, que a presença de outras mirtáceas na área de plantio seja evitada.

 

Bibliografia consultada

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MASSON, M.V. Ferrugem do eucalipto: planejamento evasivo, estimativa de dano e análise da viabilidade do controle químico. Botucatu, 2009. 167p. Dissertação (Mestrado em Agronomia) – Universidade Estadual Paulista, Botucatu, 2009.


Origem: Instituto Biológico - www.biologico.sp.gov.br
*Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal, Instituto Biológico, Av. Cons. Rodrigues Alves, 1252 – Vila Mariana, São Paulo, SP, 04014-002. 1Bolsista Iniciação Científica (CNPq/PIBIC).


Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

APARECIDO, C.C.; VALE, SL.L. do. Importância de Puccinia psidii Winter para a eucaliptocultura no Estado de São Paulo. 2010. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2010_4/puccinia/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 20/10/2010