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QUALIDADE DA MATÉRIA ORGÂNICA DE UM LATOSSOLO VERMELHO SOB ROTAÇÃO DE CULTURAS DE COBERTURA E VERÃO EM SISTEMA DE SEMEADURA DIRETA 

Sandro Roberto Brancalião
Isabella Clerici De Maria

 

INTRODUÇÃO

De acordo com Lal (2009), a demanda global por energia crescerá a uma taxa de 2,23 % ao ano até 2025, por conseguinte é extremamente importante a adoção de sistemas de produção com princípios da agricultura conservacionista, com destaque ao plantio direto que é utilizado em somente 6,4% das áreas agrícolas mundiais. Reduz emissão dos gases do efeito estufa, aumenta teor de matéria orgânica (Resende et al., 2006). A cultura da soja é uma excelente fixadora de N atmosférico, tendo muitas vezes um balanço positivo de carbono, associado a sistemas de manejo do solo, incrementando até o próprio C do agroecossistema, no caso o Sistema Plantio Diretos (SPD) devido ao maior aporte de fitomassa da gramínea em sucessão. A matéria orgânica do solo ou o carbono orgânico total têm mostrado baixa sensibilidade às mudanças promovidas pelos sistemas de manejo na dinâmica do C do solo, o que levou a utilização dos compartimentos do carbono orgânico total (COT) mais sensível ao manejo do solo, como melhores indicadores dessa dinâmica (Dou et al.,2008; Xavier et al., 2006). Além do mais, a porosidade inter e intra-agregados é elevada, afetando positivamente a dinâmica de gases e água no solo (Bayer & Mielniczuc, 2008). O carbono contido nas diferentes frações do solo, separadas, também é um indicador do grau de proteção da matéria orgânica do solo, que está menos suscetível a degradação, elevando os estoques de carbono do solo (Balabane & Plante, 2004).Por outro lado, nem sempre maiores quantidades de resíduos culturais depositadas resultam em uma maior acumulo de matéria orgânica no solo (MOS).           De Maria et al. (1999) comparou os efeitos no conteúdo acumulado de MOS, em seus 30 primeiros centímetros, de nove anos de milho ou soja no verão, ambos com aveia no inverno sob SPD e PC. Apesar dos rendimentos de matéria seca do milho (5,6 a 5,7 Mg ha-1) ter sido mais do que o dobro dos rendimentos de soja (2,1 a 2,4 Mg ha-1), esta contribuição muito maior dos resíduos do milho, não proporcionou maior acúmulo de MOS em ambos os sistemas de manejo dos solos estudados.Com relação ao processo de erosão, um fato importante que deve ser considerado é que as partículas mais finas do solo perdidas neste processo possuem uma concentração de matéria orgânica maior do que o solo como um todo (Seganfredo et al., 1997), e por isso, as perdas de nutrientes podem ser ainda maiores. A humificação bem como a decomposição de resíduo, é mediada primeiramente por processo microbiológico, controlado principalmente por variáveis locais específicas, tais como, temperatura, regime de água no solo, pH e disponibilidade de nutrientes.

                Diante do exposto, o presente trabalho teve por objetivo avaliar a humificação de um Latossolo Vermelho distroférrico após 12 anos de implantação do Sistema Plantio Diretos (SPD) e quatro anos de instalação dos tratamentos de culturas de cobertura, num ciclo de três anos de soja, finalizando com a cultura do milho em Campinas (SP).

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa foi conduzida em área experimental, situada na Fazenda Experimental Santa Elisa, pertencente ao Instituto Agronômico, com sete anos de milho contínuo verão e pousio no inverno em Campinas. Utilizou-se delineamento experimental blocos ao acaso, com quatro repetições no campo. Os tratamentos foram respectivamente T1: 0 N, T2:30 N e T3:60 kg ha-1 de N, compondo as gramíneas (sorgo - sorghum bicolor) nitrogenadas em cobertura.;T4: Leguminosa (tremoço branco-Lupinus albus) e T5: Pousio de Inverno. As culturas de cobertura foram semeadas no outono-inverno, utilizando o fertilizante na base com a fórmula 8-28-16. As parcelas foram dimensionadas para facilitar a completa mecanização do plantio das culturas de cobertura e de culturas de verão subseqüentes, sendo 10 m de frente por 20 m de comprimento, perfazendo 200 m2. A cultura da soja, safras de 2005/2006 até 2007/2008, foi a cultivar IAC-23 e na safra 2008/09, optou-se pelo milho como rotação de verão, a fim de suprimir plantas daninhas infestantes. As amostras de solo foram coletadas para avaliar a humificação (índice HFil) em mini trincheiras de 0-2,5, 2,5-5,5-10 e 10-20 cm .Avaliou-se também a variável, a razão E4/E6, nas camadas de 0-5, 5-10, 10-20 e 20-40 cm como índice de humificação do solo. Amostras de substâncias húmicas em solução foram avaliadas em experimentos com soluções de NaHCO3 0,05 mol L-1 do material orgânico em concentração entre 20 e 100 mg L-1. Os espectros de fluorescência de luz UV-Visível foram obtidos nos três modos: emissão, excitação e excitação com varredurada sincronizada (Zsolnay et al., 1999; Kalbitz et al., 1999; Milori et al., 2002). As medidas foram realizadas em equipamento de fluorescência de luz UV-Visível (Perkin-Elmer LS 50), no laboratório de Óptica da Embrapa Instrumentação Agropecuária. Foram analisadas amostras de solo, agregados organominerais, com base na utilização de um sistema de fotoluminescência, tendo como fonte um laser de Argônio (Milori et al., 2006). Em análises preliminares verificou-se que amostras de solo emitem fluorescência na região de 400 a 700 nm, quando excitadas em 350 nm. A oxidação da matéria orgânica do solo com peróxido de hidrogênio ou calcinação levou ao desaparecimento da banda de emissão, sugerindo que é oriunda da matéria orgânica do solo humificada. Este valor medido, é referente ao espectro que o aparelho apresenta, sendo assim, para que obtenhamos o índice HFIL o valor é normalizado com um denominador que é o carbono elementar da amostra. A partir dos dados da análise elementar é possível inferir sobre o teor de C, ou até mesmo da razão C/N (Nicolardot et al., 2001). A produção de fitomassa das plantas de cobertura e a produtividade do milho após três ciclos de soja também foram avaliadas. As análises estatísticas foram feitas e analisadas através do teste t de Student (5% probabilidade).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

            O índice HFil na camada mais superficial, a de 0-2,5cm (Quadro1), mostrou que significativamente todos os tratamentos foram superiores ao pousio, o que revela a importância de se utilizar culturas de cobertura e manter o solo coberto no período de entressafra. Na recuperação dessas áreas, é preciso que sejam adotados sistemas de manejo que priorizem um maior aporte de carbono ao solo, no sentido de elevar a biodisponibilidade da matéria orgânica, a qualidade do solo e mitigar as emissões de CO2 (Bayer et al., 2000).Comparando as camadas de solo para o pousio (T5) podemos verificar que superficialmente (0-2,5), a razão E4/E6 é maior, indicando uma menor humificação (Figura 1).

 

Quadro 1. Humificação em LVdistroférrico em diferentes camadas do solo, em Campinas (SP)

HFIL

T1

T2

T3

T4

T5

0-2,5

1974

1993

1828

1782

1670

2,5-5,0

2146

1711

1981

1951

2066

5,0-10

1941

2333

2488

2147

1844

10-20

2109

1883

1795

2159

1495


Média

2042

1980

2023

2010

1768

Teste t

A

A

A

A

B

 

 

Figura 1. Razão E4/E6 no T5,em diferentes camadas de um Latossolo Vermelho, Campinas (SP).

           

O que certamente é um indicador de um grande aporte de frações que ainda não foram prontamente humificadas e que também ainda não estão associadas aos minerais, que pode representar uma grande contribuição de matéria orgânica particulada, mesmo sem semeadura no outono-inverno, ou seja, mesmo no tratamento com menor aporte de resíduos, o sistema plantio direto, permite uma grande adição de matéria orgânica grosseira. Embora a humificação no Pousio (T5) seja maior, na profundidade de 5-10 cm (Figura 2), devido provavelmente ao aporte de resíduos altamente lignificados, que são característicos das plantas daninhas, ou vegetação espontânea presente neste tratamento. Provavelmente o T5 deve estar contribuindo com frações de carbono associada aos minerais, de acordo com relatos de Conceição (2005). A quantidade de fitomassa e a produtividade do milho foram maiores no tratamento T3, após três anos de soja.

 

 Figura 2. Razão E4/E6 em diferentes tratamentos na camada de 5-10 cm

 

Figura 3. Produtividade de milho e fitomassa das Culturas de Cobertura

 

Fig 4. Manejo com Segadora, Milheto 2007, na mesma área Experimental

Fig 5. Soja sobre palhada de triticale em 2008

CONCLUSÕES

            A humificação do solo foi superior para todos os tratamentos comparados ao pousio.

            Tantos os resultados obtidos no Laser como no UV-Vsível mostraram valores correspondentes a humificação para os tratamentos estudados, destacando-se a humificação abaixo de 20 cm.

            A razão E4/E6 foi um bom indicador da qualidade do solo, destacando-se a Leguminosa (T4) com menor humificação, e a maior dose de N na gramínea (T3), como significativamente o que apresentou maior humificação.

                        A quantidade de fitomassa e a produtividade do milho foram maiores no tratamento T3, após três anos de cultivo ininterruptos de soja IAC-23.

                        Este trabalho mostra a importância de se manter o solo recoberto utilizando plantas de cobertura no período de entressafra, e da administração do nitrogênio nas plantas de cobertura, quer seja no outono-inverno ou primavera, de acordo com as adequadas condições de precipitação e época de semeadura.

RESUMO

O objetivo da pesquisa foi estudar a humificação do solo obtida após 12 anos de implantação do Sistema Plantio Diretos (SPD) e quatro anos de instalação dos tratamentos de culturas de cobertura, num ciclo de três anos de soja (Glycine max), finalizando com a cultura do milho (Zea mays) em Campinas (SP). Utilizou-se delineamento experimental em blocos ao acaso, com quatro repetições no campo. Os tratamentos foram: T1: Gramínea 0N; T2: Gramínea: 30 Kg N/ha, T3: Gramínea 60 Kg N/ha; T4: Leguminosa; T5: Pousio. As amostras de solo foram coletadas em mini trincheiras com o intuito de avaliar a humificação na superfície de 0-2, 5,2, 5-5,0,5-10 e 10-20 cm para o índice HFil, e a razão E4/E6, nas camadas de 0-5;5-10;10-20 e 20-40 cm. O índice HFIL na camada mais superficial, a de 0-2,5 cm, mostrou que significativamente todos os tratamentos foram maiores que o pousio (T5), o que se revela a importância de se utilizar culturas de cobertura e manter o solo coberto no período de entressafra. A razão E4/E6 foi um bom indicador da qualidade do solo, destacando-se a Leguminosa (T4) com menor humificação, e o tratamento (T3), como significativamente o que apresentou maior humificação. As produtividades de fitomassa e de grãos do milho foram maiores no tratamento T3, após três anos de soja.

Palavras-chave: Culturas de Cobertura, Fluorescência, E4/E6.

REFERÊNCIAS

BALABANE, M.; PLANTE, F. Aggregation and carbon storage in silty soil using physical fractionation techniques. European Journal of soil Science, v.55, p.415-427, 2004

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MILORI, D. M. B. P; MARTIN-NETO, L.; BAYER, C.; MIELNICZUK, J.; BAGNATO, V. S. Humification degree of soil humic acids determined by fluorescence spectroscopy. Soil Science, v. 167, p. 739-749, 2002.

MILORI, D. M. B. P.; GALETI, H. V. A.; MARTIN-NETO, L.; DIEKOW, J.; GONZÁLEZ-PÉREZ, M.; BAYER, C.; SALTON, J. Organic matter study of whole soil sample using laser-induced fluorescence spectroscopy. Soil Science Society American Journal, v. 70, p. 57-63, 2006.

NICOLARDOT, B.; RECOUS, S.; MARY, B. Simulation of C and N mineralisation during crop residue decomposition: a simple dynamic model based on the C:N ratio of the residues. Plant Soil, v. 228, p. 83-103, 2001.

SEGANFREDO, M. L. ELTZ, F.L. F, BRUM, A.C.R. Perdas de solo, água e nutrientes por erosão em sistema de cultura em plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 21:287-291, 1997

XAVIER, F.A.S. ;MAIA, S.M.F. ;OLIVEIRA, T.S. ;MENDONÇA, E.S. Biomassa microbiana e matéria orgânica leve em solos sob sistemas agrícolas orgânico e convencionalna Chapada da Ibiapaba, CE. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.30, p.247-258, 2006.

ZSOLNAY, A.; BAIGAR, E.; JIMENEZ, M.; STEINWEG, B.; SACCOMANDI, F. Differentiating with fluorescence spectroscopy the sources of dissolved organic matter in soils subjected to drying. Chemosphere, v. 38, p. 45-50, 1999.

 

GRUPO SPDIRETO-IAC-APTA - Secretaria da Agricultura e Abastecimento (SAA).

Equipe de trabalho: Sandro Roberto Brancalião, Ladislau Martin Neto, Isabella Clerici De Maria, Heitor Cantarella, Débora Marcondes Bastos Pereira Milori, Sonia Carmela Falci Dechen , Marcelo Ticelli, Everton Luis Finoto, Edison Ulisses Ramos Jr.

 


Sandro Roberto Brancalião possui graduação em Agronomia pela Universidade Estadual Paulista - Jaboticabal (1999), mestrado em Agronomia (Agricultura) - Unesp-Botucatu (2002) e doutorado em Agricultura - Unesp-Botucatu (2005). Atualmente é pesquisador do Instituto Agronômico (IAC). Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Manejo e Física do Solo, atuando principalmente nos seguintes temas: estrutura do solo, estabilidade de agregados, cereais no inverno, nitrogênio, milheto, sistema plantio direto, cultura da soja, desenvolvimento de grandes culturas, matéria orgânica do solo, fracionamento da matéria orgânica do solo, dinâmica da matéria orgânica do solo, reciclagem de nutrientes, culturas de cobertura, culturas de reforma para cana -de-açúcar, Integração Lavoura & Pecuária e Manejo do Solo.
Contato: brancaliao@iac.sp.gov.br.

Isabella Clerici De Maria Possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade de São Paulo (1981), mestrado em Solos e Nutrição de Plantas pela Universidade de São Paulo (1986) e doutorado em Solos e Nutrição de Plantas pela Universidade de São Paulo (1995). Atualmente é pesquisadora científica e orienta em nivel de mestrado e doutorado no programa de Pós-Graduação em Agricultura Tropical e Subtropical do Instituto Agronômico. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Manejo e Conservação do Solo, atuando principalmente nos seguintes temas: erosão, plantio direto, propriedades físicas, conservação do solo e modelos de erosão.
Contato: icdmaria@iac.sp.gov.br



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

BRANCALIÃO, S.R.; DE MARIA, I.C.  Qualidade da matéria orgânica de um Latossolo Vermelho sob rotação de culturas de cobertura e verão em sistema de semeadura direta. 2011. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2011_2/PlantioDireto/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 03/05/2011