Brucelose bovina: desafios e perspectivas
Grácia Maria Soares Rosinha
A brucelose é uma zoonose presente no mundo todo, especialmente nas
regiões de clima tropical e subtropical,
com exceção de alguns poucos países desenvolvidos que conseguiram
erradicá-la ou reduzir as taxas de prevalência. Nos países em
desenvolvimento ainda trabalha-se para alcançar esta meta. É uma
doença infecciosa crônica causada por bactérias do gênero
Brucella que infectam várias
espécies de animais domésticos e silvestres, além de humanos.
A bactéria
Brucella
abortus
infecta, principalmente, bovinos de corte e leite, determinando
elevados prejuízos.
As perdas econômicas estão relacionadas a abortos, baixos índices
reprodutivos, ao aumento no intervalo entre partos, à diminuição na
produção de leite e morte de bezerros, queda da produtividade, além
de gerar barreiras internacionais ao comércio de produtos de origem
animal e perdas na indústria, com a condenação da carne e do leite e
desvalorização desses produtos.
Estudos realizados em 2013 demonstraram que o
prejuízo total da brucelose no Brasil foi estimado em U$
448 milhões que equivale, hoje, a cerca de R$ 1,005 bilhão. A cada
1% de variação na prevalência, estima-se o incremento no prejuízo de
U$ 77,85 milhões ou R$ 174,70 milhões no custo da brucelose bovina
no Brasil. As perdas por fêmea
infectada, com idade superior a 24 meses, foram estimadas em R$
473,50 e R$ 255,20 em rebanhos de leite e de corte, respectivamente.
A brucelose bovina, por tratar-se de uma zoonose, acomete o homem
determinando na maioria dos casos uma enfermidade crônica e de
difícil diagnóstico. Mais de 500 mil casos humanos de brucelose são
relatados no mundo a cada ano, embora este número possa estar
subestimado. Essa situação alarmante pode ser atribuída ao quadro
clínico não específico da brucelose humana, poucas informações sobre
a doença em países não endêmicos e deficiências em laboratórios de
diagnóstico. O número de casos em humanos está diretamente
relacionado com o número de animais infectados, principalmente
bovinos, dentro de uma definida região. Como exemplo, em um estudo
conduzido em humanos de uma comunidade urbana pobre no Nordeste do
Brasil, 13% dos indivíduos estavam positivos para
Brucella abortus (que
infecta preferencialmente bovinos) contra 4,6% positivos para
Brucella canis (que
infecta preferencialmente cães).
A exposição máxima da doença em humanos é observada entre médicos
veterinários, técnicos de inseminação, zootecnistas, produtores
rurais e funcionários de empresas de processamento de carne. As vias
mais frequentes de infeção são mucosas, vias aéreas, a pele
lesionada das mãos durante o contato com placenta infectada, fetos
abortados ou líquido amniótico, a execução de procedimentos
ginecológicos em bovinos, além do
consumo de leite e derivados não pasteurizados contaminados. A
prevalência de focos da brucelose bovina em propriedades pecuárias
no Brasil varia de 0,32% a 41,5%. Embora aparentemente pequenos,
esses índices por si só são muito expressivos e muito impactam nos
diferentes elos e segmentos das cadeias produtivas das pecuárias de
corte e de leite, da porteira à mesa. Mesmo porque nossos números
nestas cadeias são de grande monta. Com o rebanho bovino de
aproximadamente 212 milhões de cabeças, só para a produção de carne
foram abatidos 34,4 milhões no ano de 2013. Reconhecendo
a brucelose como um importante problema de saúde animal e saúde
pública, em 2001, o Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (Mapa) instituiu o Programa Nacional de Controle e
Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT), definindo
estratégias para o controle da doença no País. O programa tem o
intuito de reduzir a prevalência e a incidência de novos focos
dessas doenças e criar um número significativo de propriedades
certificadas como livres ou monitoradas para a brucelose e a
tuberculose, e desta forma reduzir o impacto destas zoonoses na
saúde animal e humana. Um aspecto
importante do PNCEBT é o estímulo às pesquisas para o aprimoramento
de técnicas de diagnóstico da brucelose, no estudo epidemiológico de
cepas de campo e em pesquisas relacionadas às características de
virulência, da patologia do agente, além de estudos que possam
desenvolver vacinas de maior eficácia e que não provoquem
interferências nos exames sorológicos.
Atualmente, as vacinas utilizadas para
prevenção das infecções causadas por
Brucella abortus em bovinos no
Brasil, são a B19 e a RB51. Ambas podem ser patogênicas aos humanos,
se cuidados especiais não forem tomados.
A vacina B19 é a mais utilizada em programas de controle da
brucelose bovina, podendo ser utilizada em fêmeas de três a oito
meses de idade. Protege cerca de 70% dos animais quando expostos ao
tipo virulento da bactéria. É uma cepa lisa que pode causar aborto
em animais prenhes e, principalmente, induzir a produção de
anticorpos contra um dos seus componentes estruturais, a cadeia O do
lipopolissacarídeo (LPS), o que pode interferir em testes
sorológicos na diferenciação de animais vacinados daqueles
naturalmente infectados.
A vacina RB51, é uma cepa rugosa, utilizada
amplamente em países como Estados Unidos, Uruguai e Chile.
No Brasil ela pode ser ministrada em fêmeas entre nove e 12 meses de
idade que não tenham sido vacinadas com a B19. Esta vacina
apesar de não interferir nos testes sorológicos,
tem a desvantagem de ser resistente à rifampicina, um dos
antibióticos usados no tratamento contra a brucelose humana.
Uma vacina ideal contra a brucelose deve
apresentar as seguintes características: i) não provocar a doença em
animais vacinados; ii) prevenir a infecção pela bactéria em animais
de ambos os sexos; iii) prevenir aborto e esterilidade; iv) promover
proteção contra a infecção por longo tempo com uma simples dose; v)
não induzir a produção de anticorpos persistentes os quais
interferem no diagnóstico de infecções a campo; vi) ser
biologicamente estável; vii) não apresentar risco de reversão da
virulência in vitro
e in vivo;
viii) não ser patogênica para humanos; e ix) ser facilmente
produzida em grande escala e baixo custo.
Dentre as perspectivas em vacinologia para a
brucelose, as pesquisas estão sendo direcionadas para
vacinas de DNA,
vacinas vivas atenuadas geneticamente e
vacinas de subunidades. Esta última composta de proteínas naturais
ou recombinantes da bactéria.
Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte Dados para citação bibliográfica(ABNT): ROSINHA, G. M. S.; Brucelose bovina: desafios e perspectivas 2014. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2014_1/brucelose/index.htm>. Acesso em: Publicado no Infobibos em 07/05/2014 |