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Considerações sobre as Estações Quarentenárias no Brasil

Dr. Renato Ferraz de Arruda Veiga(¹)

Introdução 

A agricultura é uma atividade crucial para o desenvolvimento econômico do Brasil e a área vegetal contribui imensamente à vitalidade deste setor. Para manter o país como o quinto maior produtor agrícola do mundo, e a sustentabilidade da produção de alimentos, torna-se necessário abastecer constantemente, com novos acessos, a atividade de melhoramento genético.


Figura 1. Mapa da América do Sul representado com suas escassas plantas agrícolas nativas.
 

Na pesquisa científica este melhoramento de plantas é a área mais dependente dos recursos genéticos introduzidos, os quais posteriormente são conservados nos “Bancos Ativos de Germoplasma” (BAG), e dos quais saem os acessos que vão compor as “Coleções de Trabalho” (CT) dos pesquisadores melhoristas.

O produto da atividade com a CT é o lançamento das cultivares elite para o mercado agrícola, destinadas à alimentação humana e/ou animal, ou outros usos agrícolas como o ornamental e o de produção de matérias primas, quer visando o mercado interno e/ou de exportação.

Para que os pesquisadores científicos em melhoramento genético concretizem seus objetivos, necessitam também do apoio de outros profissionais da ciência agrícola, dentre os quais se destacam os da área de Intercâmbio e Quarentena de Plantas (IQP) para fins de pesquisa (regida pela IN 1, MAPA 1998).

Estes pesquisadores, da área de IQP, são essenciais, visto que a grande maioria das espécies alimentícias, que abastecem a população brasileira, é composta por plantas de origem exótica, cujos centros de origem e/ou dispersão estão fora do nosso continente (Figura 1). Visando manter sua agricultura pujante, baseada em tais plantas exóticas (abacate, alface, alho, aveia, banana, batata, cana-de-açúcar, café, caqui, cenoura, cebola, centeio, cevada, feijão, figo, fumo, girassol, laranja, maçã, manga, mamão, mamona, milho, pera, soja, sorgo, tomate, trigo, triticale, uva e kiwi, entre outras), necessita de forte investimento em introdução de germoplasma. Este material introduzido vai para o abastecimento dos trabalhos de melhoramento genético vegetal, tanto das instituições governamentais como das multinacionais e particulares que desenvolvam pesquisas científicas no país.

Por outro lado, é justamente nos centros de origem e de dispersão das espécies de plantas agrícolas que se encontram as pragas exóticas a elas adaptadas. 

Em virtude do Brasil ser um país de grandes dimensões geográficas (8.514.876 Km2) e possuir climas diferenciados (subtropical, semi árido, equatorial, tropical, tropical de altitude e tropical úmido), isto o torna altamente sujeito à entrada de novas pragas exóticas através de suas fronteiras, as quais podem se adaptar às novas e favoráveis condições climáticas que encontram.

Sabe-se que ocorrem, nas culturas agrícolas distribuídas por todos continentes do mundo, mais de quinhentas espécies de pragas exóticas, e que se estima existir outro grande número de delas sobrevivendo de plantas hoje menos relevantes para a agricultura brasileira. Também fica claro o risco da invasão de novas pragas exóticas quando se observa a existência de mais de uma centena de espécies exóticas de pragas ocorrendo nos países fronteiriços com o Brasil. Tais pragas, pela IN 52, de 2007, são as denominadas como “quarentenárias A 1” (Ex: Colletotrichum coffeanum - responsável pela CBD no café, Fusariuni oxysporum f. sp. Cubense - responsável pelo mal de Panamá da bananeira, Fiji disease vírus na cana-de-açúcar, as moscas das frutas, etc.).

Não obstante algumas pragas quarentenárias já terem furado este sistema de proteção agrícola, e terem sido detectadas em algumas regiões do Brasil, seu controle e/ou erradicação está acontecendo através de barreiras organizadas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

Este trabalho ocorre através do monitoramento, no trânsito interno no país, da praga e das plantas hospedeiras, nas áreas onde se detectou determinada praga, visando evitar sua rápida dispersão pelo país e, se possível, efetivando a sua erradicação. À estas denomina-se como “quarentenárias A 2” (Ex: Aleurocanthus woglumi e Xanthonzonas campestris pv. citri no citros, Raoiella indica Hirst - ácaro vermelho nos coqueiros, palmeiras, bananeiras, helicônias e outras ornamentais, insetos como a Cydia pomonella na maçã e pera e Bactrocera carambolae - a mosca-da-carambola em frutíferas, a lagarta Helicoverpa armigera no algodão, feijão, soja e hortaliças, entre outras pragas não menos relevantes). Isto não impede que, para fins de inspeção fitossanitária, continuem sendo incluídas como pragas indesejáveis também no processo de importação e quarentena.


Figura 2. Quarentenário da Syngenta em Aracati. Visita do Dr. José A. Caram Souza-Dias, da Comissão de Quarentena do IAC, e Dr. Collin Jeffries, do Centro de Quarentena da Scottish Agricultural Science Agency (SASA), em 2012.

As plantas envolvidas com as pragas A2, para circularem no país necessitam da Permissão de Trânsito (PT), e se for exportado, do Certificado Fitossanitário de Origem (CFO) que por sua vez servirá para obter o Atestado de Exportação (AE), emitido pelo MAPA. Assim, sempre é bom lembrar que quando se cita o termo “intercâmbio de germoplasma” também está se referindo à exportação de plantas pelo país.


Figura 3. Imagem de uma das casas de vegetação da Estação Quarentenária do Cenargen - DF, 2012.

O Brasil é o país de maior megabiodiversidade do planeta, com mais de quarenta mil espécies de plantas catalogadas, o que nos torna também um berço de pragas potencialmente “exportáveis” para a agricultura mundial. Além disso algumas das espécies agrícolas, cultivadas no exterior e no próprio país, são nativas e/ou tem aqui um de seus centros de origem e/ou de dispersão ou ainda têm espécies parentes das cultivadas nativas no país (abóbora, açaí, algodão, araçá, arroz, amendoim, abacaxi, butiá, caju, cará, castanha-do-pará, erva-mate, goiabinha-serrana, inhame, ipeca, jabuticaba, mandioca, maracujá, melancia, moranga, cacau, cupuaçu, palmito, pitanga, pupunha, ora-pro-nobis e seringueira, entre outras).

Este fato preocupa o agronegócio de outros países, no seu processo da importação, quanto à fitossanidade do material procedente do Brasil. Isto os incentiva a elencar exigências fitossanitárias especiais, a serem cumpridas pelo nosso país, no momento da exportação. Aqui entra o trabalho relevante da inspeção de exportação que, por exemplo, realiza com maestria o IB, em São Paulo e em Campinas, dentre outros laboratórios credenciados pelo MAPA. Tais análises entram como parte do Certificado Fitossanitário (CF) do Brasil.


Figura 4. Placa da Estação Quarentenária da Canavialis, de Nível 2, em Campinas, SP., 2007.

O trabalho desenvolvido com a quarentena vegetal visa proteger nossa agricultura, e a dos demais países, deste fluxo de pragas, tanto no processo de trânsito interno de germoplasma como no intercâmbio internacional. 

As Estações Quarentenárias

O termo “quarentenário” vem de “quarentena” referindo-se a um período de quarenta dias, aplicado antigamente para os navios oriundos de países com comprovada presença de epidemias como: cólera, febre amarela e peste bubônica. Durante aqueles dias permaneciam ancorados, antes de efetuar o descarregamento de sua carga e de pessoal, aguardando a possível evidência ou não das citadas doenças dos seres humanos.

“Praga”: qualquer espécie, raça ou biótipo de vegetais, animais ou agentes patogênicos, nocivos aos vegetais ou seus produtos (inseto, ácaro, fungo, bactéria, vírus, viróide, nematóide, planta invasora, rato, caramujo, etc.).

Atualmente tal conceito foi alterado, referindo-se a um período de tempo, durante o qual as plantas permanecem em observação fitossanitária em um “quarentenário”- sinônimo para “Estação Quarentenária” (EQ), que pode variar segundo o ciclo do planta e/ou da praga quarentenária. A liberação das plantas ocorre apenas posteriormente à comprovação de isenção das citadas pragas.

No Brasil, os quarentenários ainda são classificados, pela atual legislação, em três níveis de exigência: “Nível 1” – EQ com infraestrutura completa, autorizada para executar quarentenas com todas as espécies vegetais e solo, e que possui uma Comissão Interna de Quarentena (CIQ) com pesquisadores comprovadamente capacitados, em todas as especialidades da fitossanidade; “Nível 2” – EQ, com infraestrutura completa, autorizada para executar quarentenas apenas com determinadas espécies de vegetais, e que possui uma CIQ com pesquisadores comprovadamente capacitados, em todas as especialidades da fitossanidade; “Nível 3” – EQ com infraestrutura parcial própria, no país, e quarentenário principal associado, no exterior, autorizada para executar quarentenas apenas com determinadas espécies de vegetais, e possuem uma CIQ com pesquisadores comprovadamente capacitados, em todas as especialidades da fitossanidade.


Figura 5. Portal de entrada do Complexo Quarentenário IAC “Emílio Bruno Germek”, de Nível 1, 2012.

Pelo discutido, em reuniões MAPA, percebe-se a tendência, para as legislações futuras, que permaneçam existindo apenas dois níveis de EQ, isto é, os de Níveis 1 e 2.

É bom relembrar que as EQ tem seu trabalho exclusivamente direcionado para combater as “pragas quarentenárias”, no caso do Brasil apenas as Pragas A1 e A2, ficando de fora as pragas nativas, e que estas comumente não se credenciam para executar a chamada “inspeção fitossanitária de exportação”.

As EQ brasileiras vêm realizando um trabalho fantástico em benefício da agricultura nacional, evitando a entrada de pragas exóticas na nossa agricultura, com infindáveis exemplos de sua contenção e/ou eliminação.

Nesta atividade científica, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) reinou praticamente sozinho no Brasil, desde a década de vinte, quando da criação da legislação fitossanitária do país, até a década de setenta, época em que foi criado o Centro Nacional de Recursos Genéticos na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (CENARGEN/EMBRAPA), hoje Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília – DF. No início o IAC compartilhou a autorização para intercâmbio e quarentena com a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), mas somente o IAC prosseguiu e, em 1997, também foi aprovado como EQ Nível 1.


Figura 6. Cana-de-açúcar, na Estação Quarentenária do IAC, em 2010.

Atualmente observa-se um grande interesse na construção de novas EQ, no Brasil. Exemplo disto está na própria Embrapa, com a aprovação em 2010 do novo Centro de Quarentena, apenas para prestação de serviços, também em Brasília – DF, ficando a atual EQ com a pesquisa científica. Ainda temos o do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), e de algumas empresas particulares que também vem demonstrado interesse nesta fatia do mercado, pensando como um negócio, como por exemplo o de Viçosa – MG, todos com propostas de trabalho como Nível 1.

Na categoria de Nível 2, temos algumas EQ operando no país como: Canavialis – Campinas, SP (cana-de-açúcar, sorgo sacarino), do MAPA/CEPLAC – Salvador, BA (cacau) e da Syngenta – Aracati, CE (melão, melancia, soja, milho, tomate, pimentão, Brassica oleracea, pepino, abóbora, cana-de-açúcar, eucalipto, beterraba açucareira), e recentemente a Seminis – Igarapé, MG (Hortaliças). Ainda com o nível 2, também há interesses na construção de novos, como na Bayer – Campinas, SP.  Porém, algumas EQ, deste nível, já foram desativados, como: Planalsucar - Araras, SP e Copersucar (depois o CTC) – Miracatu, SP (Saccharum e seus híbridos dos gêneros Saccharum, Erianthus sect. Ripidium, Sclerostachya, Narenga e Miscanthus).


Figura 7. Equipe da Estação Quarentenária do IAC, em 2011.

As EQs Nível 3, montados no país são: Monsoy Ltda. – Morrinhos, GO (soja), Pioneer Sementes Ltda. – Itumbiara, GO (milho, soja), Nidera Sementes – Uberlândia, MG (girassol, milho, soja, sorgo e trigo), Pioneer Hi-Bred International – Coxilha, RS e Planaltina, DF (milho e soja), e Monsanto – Uberlândia, MG (Milho). Pelo alto risco fitossanitário para o país, considero que não deveriam existir os EQ deste nível, as quais deveriam ser adaptados para se transformar em Nível 2.

Destas EQs citadas, tivemos o prazer de colaborar com a organização, na planta, dos quarentenários da Syngenta (em atividade), de Viçosa e do IAPAR (em estudos de viabilidade), e inclusive com o novo proposto pela EMBRAPA, para o seu Centro de Quarentena.

Além das EQ de Plantas citadas, ainda há no Brasil mais duas categorias para a pesquisa científica: a) animais e b) organismos benéficos e de controle biológico. O MAPA por exemplo possui o seu quarentenário Nível 1, da área animal, em Cananéia - SP, inaugurada em 1971, a qual depois de fechar por alguns anos, foi reativada em 2009, não existindo nenhum outro do gênero no país.  A Embrapa também tem outro quarentenário, na Embrapa Meio Ambiente, em Jaguariúna - SP, desde a década de noventa, que trabalha com a intercâmbio de organismos vivos, considerado também Nível 1 e único na categoria no país!

Um breve histórico da Estação Quarentenária do IAC 

Este histórico é perfeitamente justificável, pois o IAC permaneceu por aproximadamente quarenta anos atuando praticamente sozinho nesta tarefa, e depois mais de trinta em conjunto com o CENARGEN, sem nunca possibilitar o escape de uma praga quarentenária no Brasil. Com muito orgulho faço parte integrante desta história mais recente, na qual herdei muitos conhecimentos de meus antecessores na atividade, em especial do Dr. Alcides e do Dr. Germek (no IAC), e dos colegas do CENARGEN e do MAPA, com os quais tive a honra e o prazer de conviver.


Figura 8. Casa-de-vegetação do quarentenário antigo do IAC, com quarentena de amendoim em primeiro plano, 1982.

Até a década de oitenta, o IAC trabalhou com apenas um pesquisador responsável pelo Setor de Intercâmbio e Quarentena de Plantas (SIQP), Carlos Arnaldo Krug (1928-1934), Alcides Carvalho (1934-1950), Luiz Aristeu Nucci (1950-1958) e Emílio Bruno Germek (1958-1981).

Neste esquema, atendendo somente à introdução de plantas dos trabalhos dos pesquisadores do IAC, o coordenador do SIQP convidava os colegas especialistas em fitossanidade da própria instituição, quem e quando considerasse necessário, para auxiliarem nas inspeções, e o MAPA designava um especialista do Instituto Biológico de São Paulo (IB) para efetivar a liberação das quarentenas.

No início dos anos de 1980, quando assumi esta atividade pelo SIQP como uma prestação de serviços, cheguei a trabalhar sozinho devido à aposentadoria em massa no setor, quando saíram o Dr. Germek, seu auxiliar técnico Sr. Agostinho e a secretária Dona Rute. Nesta época realizei todas as tarefas de introdução, quarentena e exportação de plantas pelo IAC, o que me proporcionou grande experiência na área, em detrimento da minha carreira de pesquisador científico em botânica. No entanto foi uma oportunidade única de me aprimorar nesta atividade agronômica, o que rendeu grandes amizades na Vigilância Agropecuária (Vigiagro)/MAPA-SP e no Posto de Serviço de Viracopos (Podesv), basta ver nossas publicações conjuntas (Veiga et al. 1983, 1992 e 2007). Na época também herdei uma infraestrutura totalmente desestruturada, sem sala de abertura de volumes e uma casa de vegetação precária e sem divisórias (Figura 7), situada na Av. Barão de Itapura 1481, na sede do IAC, além de salas e laboratório no Edifício Frans Wilhelm Daffert.


Figura 9. Quarentenário de Cana-de-açúcar, construído anexo à Estação Quarentenária do IAC, em 2010.

Em virtude disto optei por criar uma CIQ de Plantas que me auxiliasse nos trabalhos de inspeção e análise fitossanitária. A diretoria geral do IAC aprovou a ideia e me nomeou para Coordenador, e os demais pesquisadores foram selecionados dentre a equipe do Centro de Fitossanidade (CF) do IAC. Tal comissão foi planejada para ter um especialista titular e um suplente de cada área da fitossanidade (nematoide, patologia de sementes, fungo de plantas, vírus, microscopia eletrônica, bactérias, e insetos), como recomendado internacionalmente na época.


Figura 10. Atual Complexo da Estação Quarentenária do IAC e Complexo de Conservação de RFG do IAC – 2012.

Com o tempo conseguimos mais funcionários, através de concurso público, e a sala de abertura de volumes à prova de escape de insetos, mesmo que adaptada.

Com estas alterações os colegas do IB, indicados pelo MAPA, apareciam apenas para o ato de liberação das quarentenas no SIQP. Esta situação permaneceu, por quase duas décadas, com esporádicas visitas dos colegas do MAPA – SP e/ou MAPA Viracopos – Campinas - SP, mas devo ressaltar que este esquema sempre funcionou muito bem.

Para a exportação, até o final da década de noventa, o próprio IAC se responsabilizava pela fitossanidade do seu germoplasma doado. Realizava a limpeza e seleção do material a ser exportado, preparava a embalagem, digitava as informações necessárias no pedido de inspeção de exportação e elaborava o CF. Depois, transportava este volume para o Serviço de Vigilância Sanitária /MAPA em São Paulo, onde era examinado, lacrado e o CF assinado pelo fiscal.

A falta de uma infraestrutura mais segura em recursos fitogenéticos (RFG) no IAC, na época, nos motivou a elaborar um projeto cujas obras foram concluídas, em parte, em 1997, na Av. Theodureto de Almeida Camargo, 1500. Surgia assim o novo Complexo Quarentenário IAC “Emílio Bruno Germek”, baseado no modelo da infraestrutura do quarentenário da Copersucar de Miracatu – SP. Foram efetivadas algumas adaptações no projeto como a inclusão de laboratório e salas de pesquisadores. Seu foco ainda era o de atender apenas ao público interno do próprio IAC.


Figura 11. Nova ampliação, alto grau de segurança, do Complexo Quarentenário IAC, anexa ao quarentenário de cana- de- açúcar, apoio parcial da BASF, em 2012.
 

No entanto, ainda em 1997, antes de iniciarmos o uso do quarentenário, durante a inspeção de aprovação pelo MAPA, também com a presença de pesquisadores do CENARGEN e da CTNBio, nos foi solicitado que nos transformássemos numa EQ nível 1, alegando que a demanda na EMBRAPA estava muito acima da sua capacidade. Como estávamos com o edifício recém construído e ocioso, e em virtude da previsão de restrição ao intercâmbio decorrente das novas legislações que avançavam no Brasil e através do mundo – de acesso a recursos genéticos e de registro e proteção de cultivares - decidimos aceitar tal proposta, e a EQ foi oficialmente aprovada pelo MAPA.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) também validou o uso do quarentenário IAC, através do Certificado de Qualidade em Biossegurança (CQB), e em decorrência disto realizou-se, no IAC, a primeira quarentena oficial de uma planta transgênica (milho) no Brasil, sendo o início da prestação de serviços para o público externo.

Naquela época o MAPA comumente realizava uma visita anual, mas a partir da década de 2.000 decidiu colocar um fiscal diretamente no Complexo Quarentenário do IAC, o que já ocorria no CENARGEN. Também passaram a efetivar uma inspeção anual com especialistas de outros estados. Este fato louvável, se por um lado agilizou os pareceres de liberação, facilitando o trabalho tanto para o IAC como para as empresas importadoras, por outro lado mostrou um novo aspecto indesejável que foi o aparecimento de atritos entre o MAPA e o IAC, por diferenças de opiniões científicas, algo que jamais ocorrera em toda história anterior da EQ IAC.

Devo deixar claro que, apesar disto, jamais nos omitimos de fazer qualquer alteração, muito pelo contrário, tentamos sempre nos antecipar à qualquer legislação que porventura viesse a ser aprovada. Registre-se que por boa vontade de nossa parte disponibilizamos uma sala exclusiva para alojar os fiscais do MAPA, dentro da EQ, assim como elaboramos programas que facilitaram o acompanhamento dos processos.


Figura 12. Reunião ordinária da Comissão de Quarentena do IAC, com a presença do técnico do MAPA, fiscal da Estação do IAC, em 2012.

Qual o foco das Estações Quarentenárias de Plantas e o dos Fiscais do MAPA?

Pensando em Quarentena, o foco de ambos logicamente é a importação e o potencial risco da introdução das pragas exóticas, em especial as consideradas quarentenárias A1 e A2!


Figura 13. Vista parcial da Estação Quarentenária, Nível 1, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia - DF., 2012.

O MAPA é a instituição que tem as atribuições para acompanhar, auditar e fiscalizar as atividades das estações quarentenárias, no Brasil. Ao fiscal cabe também a emissão do laudo final de liberação do material quarentemado.

Cabe às EQs as atribuições de execução de quarentenas pós-entrada e emissão do Laudo Final de Inspeção (LFI), no germoplasma importado, que servirá de base para emissão do Laudo de Liberação (LL) pelo fiscal.

No ato da proposta de registro de uma EQ ao Diretor do Departamento de Defesa e Inspeção Vegetal (DDIV/MAPA) segue, dentre outros documentos exigidos, tanto curriculum vitae dos pesquisadores que comporão a sua CIQ, como a metodologia científica que será empregada, para as finalidades e culturas propostas, ocorrendo o mesmo quando da substituição de um de seus membros. Outros requisitos importantes são a estrutura física, com seus laboratórios, casas-de-vegetação e campos experimentais, bem como o equipamento utilizado.

Para exercer o seu trabalho de pesquisa científica, os membros da CIQ se baseiam em trabalhos científicos, cujas metodologias além de serem comprovadamente eficientes, ainda são utilizadas mundialmente. Em alguns casos específicos estes pesquisadores são obrigados a criar ou aprimorar metodologias, conforme surgem novas pragas quarentenárias. É importante ressaltar que tais cientistas rubricam os seus laudos, chancelados pelo seu Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA), e que o Coordenador da Comissão faz o mesmo ao elaborar o LFI, o que dá extrema respeitabilidade aos laudos de inspeção das EQ.

Como já vimos o técnico do MAPA, nas EQs, ao final de cada quarentena emite o seu LL, também chancelado com o seu CREA. É a isto que chamamos de parceria, com confiança profissional entre as partes.

Do ponto de vista de quarentena, levando-se em consideração o foco citado anteriormente, tornam-se irrelevantes para fins dos trabalhos da EQ, alguns tópicos como: a) análise de contaminação da água de rega; b) fitossanidade dos substratos utilizados para o plantio; c) local do preparo do substrato, entre outros que não se refiram às pragas exóticas e/ou quarentenárias. Todos estes, bem como outros itens somente são analisados ou alterados a pedido dos próprios membros da CIQ, caso alguma praga nativa possa mascarar o método utilizado na EQ.

Fica claro que há necessidade de revisões mais frequentes da legislação fitossanitária (LF) sobre as EQ, em especial quanto à uniformização em infraestrutura, que hoje seguem a IN 16, MAPA 1999, e das normas, procedimentos e protocolos quarentenários, documentos internos que deveriam ir além das enquadradas no Manual de Procedimentos para Tratamentos Fitossanitários com Fins Quarentenários, MAPA – 2006, das Normas do Comitê de Sanidade Vegetal do Cone Sul (COSAVE), e das Normas Internacionais de Medidas Fitossanitárias (NIMF 15).


Figura 14. Reunião da Comissão de Quarentena da Syngenta, em Fortaleza – 2011.

Ressalte-se que o fiscal do MAPA é um profissional do mais alto gabarito, em especial por sua capacidade e dedicação, pois fiscaliza, no dia a dia, ações nas áreas mais diversas da fitossanidade, como: acarologia, entomologia, fitopatologia, identificação genética, microscopia eletrônica, nematologia, patologia de sementes, plantas invasoras e virologia. Além disso, este técnico ainda tem que possuir conhecimentos dos sintomas de pragas nas plantas vivas, de deficiência em nutrição de plantas, nas mais diversas culturas agrícolas.

Não bastasse tudo isto, o fiscal ainda tem que lidar com sua inteligência emocional, a ponto de saber que enquanto parceiro externo deve colaborar com o funcionamento das EQs no país, auxiliando o responsável pela estação a executar o seu trabalho com a devida segurança e solicitando que siga a International Plant Protection Convention - FAO, assinada em 1951 e ratificada pelo Brasil em 1961, mas exigindo apenas o que está vigente legalmente no país, na forma de lei e normas, publicadas pelo MAPA. 

Sugestões para que o MAPA apoie as Estações Quarentenárias

1.  O MAPA poderia coordenar um projeto para começar a apoiar financeiramente todas EQ oficiais do Brasil que prestam um serviço comunitário;

2.  O MAPA poderia promover eventos nacionais com a presença obrigatória de todos os membros das CIQ das EQ brasileiras, além dos próprios fiscais do MAPA, para se uniformizar procedimentos, aprimorar legislações, ampliar medidas de Segurança Nacional e incrementar a parceria;

3.  O MAPA poderia incentivar a construção de novas EQ oficiais Nível 1, a serem distribuídos estrategicamente pelo país, pois ainda temos 25 estados para instalá-los, excetuando-se São Paulo (IAC) e o Distrito Federal (Embrapa). Se computarmos os de Níveis 2 e 3, ainda assim teremos 20 estados sem nenhuma EQ instalada;

4.  O MAPA poderia atualizar a LF para a pesquisa científica e EQs, criando novas normas e procedimentos básicos para uniformizar e auxiliar nas ações internas das EQ;

5.  Pensando a atividade como uma parceria, que exige confiança entre as partes, o fiscal que se responsabiliza por determinada estação, também deveria ser avaliado pela EQ, através de um formulário elaborado pelo próprio MAPA;

6.  O MAPA, ao elaborar as legislações e ao treinar seus fiscais, deveria levar em consideração que cada EQ tem suas próprias características: se federais, estaduais ou multinacionais, e que, por questões legais, não podem e não devem ser tratadas como iguais. Um bom exemplo disto está nas contratações de pessoal que nas instituições federal e estadual, dependem de concursos públicos, enquanto as multinacionais têm a liberdade e a agilidade necessária para efetivar uma reposição de funcionário aposentado ou transferido, ou mesmo para efetivar uma nova contratação. 

Outras Publicações do Autor, em Intercâmbio e Quarentena de Plantas

1.     Veiga, R.F.A., Aranha, C., Oliveira, W.R. Informações sobre o Serviço de Introdução de Plantas do Instituto Agronômico. Instituto Agronômico, Campinas. Circular IAC 122, 35p. 1983.

2.   Veiga, R.F.A., Germek, E.B., Faria, J.T., Oliveira, W.R., Nucci, T.A. & Coelho, S.M.B.M. O Sistema de Introdução e Quarentena de Plantas do Instituto Agronômico e os Procedimentos Necessários ao Intercâmbio de Germoplasma. Campinas, Insituto Agronômico. Documentos IAC, 23. 20p. 1992.

3. Veiga, R.F.A. Importância da Sanidade Vegetal na Introdução de Plantas Ornamentais. In: Almeida, I.M.G., Malavolta Jr., V.A., Imenes, S.L. (eds.). Problemas Fitossanitários em Plantas Ornamentais. Instituto Biológico, Campinas,  110pg. V.1, pg.1-11, 1997.

4.  Veiga, R.F.A. Novo Quarentenário do IAC aprimora Intercâmbio de Germoplasma. Campinas, Instituto Agronômico. O Agronômico, v. 47-50, pg. 64-65, 1995-1998.

5.  Veiga, R.F.A. Intercâmbio e Quarentena de Recursos Fitogenéticos. In:  Beretta, A & Rivas, M. (Coords). Estrategia en recursos fitogenéticos para los países del Cono Sur. Montevideo, IICA. pg. 59-64. 2001.

6. Veiga, R.F.A., Barbosa, W., Tombolato, A.F.C., Costa, A.A., Benatti Jr. R. Quarentenário de Plantas no Instituto Agronômico. Campinas: Instituto Agronômico. O Agronômico, 56(1), pg. 24-26, 2004.

7. Veiga, R.F.A. Importação de Oleráceas e Ornamentais. 2004. Unesp, Botucatu, Summa Phytopathologica, v.30, nO 1., pg.177-179, 2004.

8. Veiga, R.F.A., Prezotto, T., Bassetto, J.L.  Introdução de Germoplasma de Espécies Ornamentais, Nativas e Exóticas. Artigo em hipertexto. Disponível em http://www.infobibos.com/Artigos/2007_3/Germo/Index.htm. Acesso em 31/07/ 2007.  15p.

9.   Veiga, R.F.A. A importação e a quarentena de germoplasma vegetal no Brasil. 2007. Artigo em hipertexto. Disponível em http://www.infobibos.com/ Artigos/ 2007_1/ quarentena/index.htm. Acesso em 05/03/2007. 4p.

10.  Veiga, R.F.A., Ares, I., Condon, F., Ferreira, F.R.  Intercambio Seguro de Recursos Fitogenéticos. In: PROCISUR & IICA (eds.). Estrategia en los Recursos Fitogenéticos para los Países del Cono Sur. Montevideo, v.1, pg.75-83, 2010.

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(¹) O Dr. RENATO FERRAZ DE ARRUDA VEIGA atualmente é pesquisador científico do Centro de Recursos Genéticos do IAC, e foi o responsável pelo serviço de intercâmbio e quarentena de plantas, do Instituto Agronômico de Campinas, por 30 anos (1982-2012). 


Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

VEIGA, R. F. A.; Considerações sobre as Estações Quarentenárias no Brasil 2014. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2014_1/quarentenarias/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 24/04/2014

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