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MEDIDAS DA DENSIDADE DO LODO PROVENIENTE DE DIGESTÃO ANAERÓBIA

Sara Rachel Orsi Moretto
Rogerio Francisco Küster Puppi
Eduardo Sabino Pegorini
Pamila Sayuri Inoue
Guilherme Girardeli de Oliveira

 

INTRODUÇÃO

Pelo fato de representar uma porcentagem considerável do custo de operação de uma ETE (20-60%), as escolhas de alternativas para o processamento do lodo e para a disposição final do mesmo devem ser partes integrantes do projeto de uma ETE, considerando-se a qualidade do esgoto a ser tratado e o tipo de tratamento deste esgoto. A partir destas escolhas, a ETE deve apresentar estrutura física e gerencial compatível com as atividades a serem desenvolvidas (FERNANDES et al., 2001). Para a gestão técnica e econômica do processo é necessário que se faça o controle de qualidade e quantidade do lodo.

O volume  de uma determinada massa úmida de lodo  pode ser calculado se o valor da densidade  desta massa é conhecido. Alternativamente, é possível determinar a massa do lodo se o seu volume e densidade são conhecidos. Supondo que o lodo tenha um teor de sólidos total  conhecido, é possível também relacionar o volume do lodo com sua massa seca ou sólida  e com a densidade aparente (definida mais adiante) do lodo, para este teor de sólidos, como mostra a equação (1).

(1)

Onde,

(2)

e

(3)

A equação (1) é bastante útil para o dimensionamento das etapas de tratamento e disposição final do lodo, quando se tem por base a vazão do lodo em diversas etapas de processamento do lodo como, por exemplo, a vazão de descarte e a vazão de disposição final. Estas vazões são normalmente relacionadas com a carga de sólidos, conforme equação (4) (SPERLING; GONÇALVES, 2001).

(4)

Sob o ponto de vista econômico, o lodo processado e disposto apresenta um custo por metro cúbico ou por tonelada disposta. Os custos de manuseio e transporte são normalmente calculados com base no volume do lodo úmido (R$ por m3 de lodo), porém muitas vezes se faz o cálculo com base na massa seca do lodo (R$ por kg ST), para efeito comparativo entre alternativas (FERNANDES et al., 2001). Este fato também evidencia a utilidade da equação (1).

Assim, é importante conhecer de maneira confiável o teor de sólidos totais do lodo e a densidade do lodo para este teor de sólidos, a fim de se relacionar a massa e volume de lodo para o teor de sólidos desejado. Em cálculos mais grosseiros, quando não se conhece a densidade do lodo, normalmente ela é considerada como 1000 kg/m3 (densidade da água pura a 4°C), por ser frequentemente próxima a este valor nas diversas etapas do processamento do lodo.

Uma vez que as propriedades físicas determinadas neste trabalho, como a densidade de partículas, a densidade aparente, a densidade do lodo úmido e a porosidade total, são definidas e amplamente utilizadas em Física do Solo, e como as metodologias utilizadas para medir estas grandezas também provem desta área de conhecimento, definiremos, a seguir, estas grandezas segundo a Física do Solo. Para a referida área, o solo é considerado um sistema multicomponente, integrado pelas fases sólida, líquida e gasosa, sendo estas duas últimas complementares, ou seja, a porção do espaço poroso não ocupada pela fase líquida é ocupada pela fase gasosa e vice versa. A fase líquida pode estar presente de forma completa (solo saturado) ou parcialmente. As fases líquida e sólida compõem a porosidade total do solo.

Consideremos uma quantidade de solo de massa total , composta por uma massa de sólidos , uma massa de líquidos (água ou solução do solo) , e por uma massa de gases (ar do solo), normalmente desprezível na prática, . De maneira similar, supõe-se que o volume total  desta quantidade de solo seja composto por um volume de sólidos , um volume de líquidos , e um volume de gases , de forma que:

(5)

 

(6)

Define-se a densidade de partículas , como a razão entre a massa total das partículas sólidas pelo volume destas partículas, excluindo-se os espaços porosos entre as mesmas, tal que:

(7)

A medida da densidade de partículas é importante para a determinação da porosidade total do solo, das taxas de sedimentação de partículas em fluidos, etc. Para a obtenção experimental de , deve-se medir a massa e o volume da amostra. A massa é medida diretamente através de uma balança, e o volume pode ser medido diretamente através do volume de líquido (normalmente álcool etílico) deslocado pelas partículas sólidas (método do balão volumétrico) (EMBRAPA, 1997), ou o volume pode ser calculado através da massa e densidade da água (ou outro fluido), deslocada pela amostra (método do picnômetro e método da submersão) (BLAKE; HARTGE,1994a).

Quando o solo estiver seco, apenas as fases sólida e gasosa estarão presentes. A densidade aparente  é definida como a razão entre a massa do solo seco e o volume da amostra quando retirada de campo, ou seja:

(8)

Onde  é a fração volumétrica de sólidos.

A densidade aparente é um parâmetro extremamente útil na medida da porosidade total do solo quando a densidade de partículas é conhecida, na conversão de massas em volumes, para estimar massas de solo dispostas em volumes muito grandes, etc. Para solos que dilatam e contraem, ela depende do grau de umidade assim como da natureza e arranjamento das partículas (CULLEY, 1993). A determinação experimental da densidade aparente consiste na secagem (a 105 °C) e medida da massa da amostra de solo, e o volume pode ser previamente conhecido (método do anel volumétrico, método da proveta, core method), ou precisa ser determinado (método do torrão, excavation method) (EMBRAPA, 1997; BLAKE e HARTGE, 1994b). A densidade aparente pode também ser determinada através de medidas de transmissão ou espalhamento de radiação gama (radiation methods) (BLAKE; HARTGE, 1994b).

Para a determinação da densidade do solo úmido , deve-se levar em conta a massa de líquido da amostra, ou seja,

(9)

Onde corresponde à fração volumétrica da porção líquida do solo, e corresponde à densidade desta porção líquida, normalmente tomada como água pura. A fração volumétrica da porção líquida está relacionada com a densidade do solo úmido e densidade aparente, como mostra a equação (10).

(10)

Conforme a equação (3), a densidade aparente também pode ser determinada através da densidade da amostra úmida.

Alguns autores (LAL; SHUKLA, 2004) definem a densidade aparente seca e a densidade aparente úmida. A primeira corresponde à densidade aparente definida pela equação (8) e a segunda à densidade da amostra úmida, conforme equação (9). Neste trabalho, por questão de simplicidade, o termo densidade poderá ser utilizado com o mesmo sentido de densidade úmida.

A porosidade total, definida como a razão entre a soma dos volumes das porções líquida e gasosa pelo volume total da amostra, é mostrada abaixo.

(11)

Onde é a fração volumétrica da porção gasosa.

Como    , e como (equação (8)), tem-se que:

(12)

Como a densidade de partículas é relativamente invariante no tempo, as mudanças na porosidade total devem-se à densidade aparente (CULLEY, 1993). Quanto maior o valor da densidade aparente, menor é a porosidade total do solo, seja pela natureza e arranjamento das partículas sólidas e teor de umidade do solo, ou pela compactação do solo (PREVEDELLO, 1996).

A porosidade total pode ser calculada através das medidas de densidade de partículas e densidade aparente, descritas anteriormente, ou determinada diretamente através do método do picnômetro a gás (DANIELSON; SUTHERLAND, 1994).

O objetivo do presente trabalho é implementar metodologias para medidas experimentais de densidade do lodo proveniente de tratamento biológico por reatores UASB e sujeito ao desaguamento mecânico através de centrífuga. Como consequência, foram obtidas curvas da densidade do lodo úmido, da densidade aparente e da porosidade total, todas em função do teor de sólidos totais do lodo, cujas medidas foram tomadas durante o descarte, durante a centrifugação e durante seis meses, tempo maior que o tempo normal que o lodo fica disposto no pátio de cura e secagem da ETE escolhida para este estudo. Medidas da densidade de partículas também foram realizadas, afim de que se pudesse determinar a porosidade total do lodo para os diversos teores de sólidos analisados.

Devido à ausência de metodologias formais para a determinação da densidade do lodo em muitas ETEs, incluindo a ETE CIC Xisto, e devido ao fato da referida ETE estar entre as maiores geradoras de lodo da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), além de ser uma Unidade Gerenciadora de Lodo, que recebe anualmente cerca de 1000 m3 de lodo de outras estações da RMC, para serem caleados e posteriormente enviados à agricultura, juntamente com o lodo produzido nesta ETE, optamos pela escolha desta estação para a realização do trabalho. Outra característica importante desta ETE, é que lá o desaguamento do lodo é feito por centrífuga, que é o método mais utilizado no estado, depois de leitos de secagem.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

A ETE CIC Xisto realiza tratamento biológico de esgoto através de sete reatores UASB, cuja vazão média para cada reator é de 70 L/s e pós-tratamento em lagoa de sedimentação, atendendo uma população total de 320 mil pessoas. Os efluentes dos reatores seguem para a lagoa de sedimentação, enquanto o lodo descartado segue para um adensador, cuja função atual tem sido apenas receber e homogeneizar, através de um mixer eletromecânico, o lodo descartado, que seguirá para o desaguamento mecânico, realizado por uma centrífuga (Pieralise, modelo FP 600 rs2). O lodo recebe a adição de polímero catiônico na proporção de 2 a 3 kg por tonelada de massa seca. Nos procedimentos normais da estação, após passar pela centrífuga, o lodo desaguado recebe aproximadamente 0,5 t de cal dolomítica, para cada tonelada de massa seca do lodo centrifugado e, posteriormente, é conduzido para uma baia de estocagem temporária. Mensalmente, quando a baia está totalmente preenchida, o lodo é disposto no pátio de cura e secagem através de retroescavadeiras, e cada lote disposto recebe uma adição superficial de cal, permanecendo no pátio por um período de aproximadamente quatro meses (um mês para caleação – quando a caleação não ocorre automaticamente, um mês para cura, um mês para a chegada das análises laboratoriais específicas para a utilização agrícola, e um mês para busca de locais apropriados para a disposição, carregamento e aplicação).

No caso específico deste experimento, com o intuito de diminuir variáveis que viessem interferir na densidade do lodo, optou-se por não adicionar cal à massa de lodo em nenhuma circunstância, ou seja, após a centrifugação e no pátio de cura e secagem. Optou-se também não deslocar a massa do lodo quando o mesmo estivesse disposto no pátio de cura e secagem, evitando que o lodo fosse sujeito a qualquer tipo de revolvimento. A idéia era também amostrar uma única massa de lodo, cuja umidade variasse no tempo e que estivesse inicialmente no adensador, posteriormente na baia (após a centrifugação) e, finalmente, no pátio de cura e secagem. Por uma questão de praticidade, estes lodos foram denominados, respectivamente, de lodo líquido, lodo após centrifugação e lodo sólido. Amostrou-se uma massa de lodo, denominada lote 1, realizando  medições da densidade do lodo líquido e do lodo após centrifugação, num período que foi de meados de agosto a início de setembro de 2009, que foi o tempo levado para centrifugar a massa de lodo desejada. Quando deveriam ser iniciadas as amostragens do lodo sólido, já disposto no pátio de cura e secagem, esta massa, de aproximadamente 100 m3, foi inundada devido às fortes chuvas ocorridas no final de setembro de 2009. Resolveu-se centrifugar outro lote de lodo proveniente de outros descartes, denominado lote 2, e amostrá-lo apenas quando disposto no pátio de cura e secagem (lodo sólido). Este lodo foi disposto no pátio em meados de fevereiro de 2010, e alguns dias depois iniciaram se as amostragens, que se estenderam até inicio de setembro de 2010, ou seja, durante aproximadamente seis meses. O volume deste lodo, quando disposto inicialmente no pátio, era de aproximadamente 85 m3.

 

Medidas da Densidade (lodo úmido)

 

Lodo Líquido (Lote 1)

Foram extraídas 42 amostras de lodo homogeneizado no adensador, resultante de seis descartes (dois do Ralf 03 e quatro do Ralf 07). Para cada quantidade de lodo retirado do adensador, com um recipiente adequado, a temperatura do lodo e a temperatura ambiente eram medidas por um termômetro digital, e duas provetas, com volumes de 500 ml e massas aferidas, eram preenchidas. As massas das provetas preenchidas com lodo eram medidas em balança digital e a densidade do lodo determinada. Seis provetas foram utilizadas e a coleta das 42 amostras ocorreu em quatro dias (8 no 1o dia, 18 no 2o, 8 no 3o e 8 no 4o), num período de quatro semanas (meados de agosto a início de setembro de 2009), que foi o período que o lodo descartado levou para ser centrifugado. Para cada dia de coleta, após a medição da densidade para cada uma das amostras, estas eram dispostas em um recipiente, onde no final de todas as medições, para aquele dia, a massa resultante era homogeneizada e três pequenas amostras eram retiradas para a determinação do teor de sólidos totais, para cada uma destas amostras, de forma que a média entre os três valores obtidos representasse o conjunto de amostras coletadas naquele determinado dia.

 

Lodo Após Centrifugação (Lote 1)

 Durante as mesmas quatro semanas de medições com o lodo líquido, foram extraídas, também em quatro dias, 34 amostras de lodo (8 no 1o dia, 8 no 2o, 6 no 3o e 12 no 4o) na saída da centrífuga. Com uma bandeja bem próxima à saída da centrífuga, deixava-se o lodo cair sobre ela, até que grande parte da bandeja fosse preenchida. A temperatura do lodo e a temperatura ambiente também eram medidas por um termômetro digital, e um cilindro vazado de aço inox, com uma das extremidades cortantes, era introduzido manualmente na massa de lodo pelo lado cortante, até que o lodo extravasasse pela extremidade superior. A massa ao redor do cilindro era retirada com uma espátula, e esta mesma espátula era introduzida por baixo do cilindro, a fim de retirá-lo da bandeja. Com uma espátula cortante, a massa de lodo que extravasou a extremidade superior era retirada e uma tampa de teflon era encaixada nesta extremidade. O cilindro era virado e limpo e sua massa medida em balança digital. Com o volume e a massa do cilindro aferidos, a densidade do lodo era determinada. Foram utilizados cinco cilindros de aço inox, com volumes variando de 398,58 cm3 a 439,56 cm3. A metodologia para a determinação da densidade do lodo após centrifugação está baseada na metodologia para medida de Densidade Aparente, Método do Anel Volumétrico (EMBRAPA, 1997), com algumas adaptações, uma vez que se mediu a densidade do lodo úmido, trabalhou-se com cilindros e não anéis, etc. O teor de sólidos totais, para um conjunto de amostras retiradas num determinado dia, foi obtido de forma semelhante ao obtido com o lodo líquido.

 

Lodo Sólido (Lote 2)

Os 85 m3 iniciais de lodo sólido resultaram da centrifugação de lodos originários de cinco descartes (dois do Ralf 02 e três do Ralf 06). Esta massa foi distribuída numa área aproximadamente retangular, onde se fez uma passagem central, resultando numa disposição em forma de U (dois retângulos maiores de 22m x 2,5m e um retângulo menor de 18,5m x 2,2m). O lodo retirado para formar a passagem foi disposto sobre a massa restante, de forma que a altura inicial da massa do lodo sólido estava em torno de 0,70m. Durante um período de seis meses, foram extraídas 110 amostras, num total de oito dias de coleta (10 no 1o dia, 9 no 2o, 16 no 3o e 15 no 4o, 5o, 6o , 7o e 8o dias), correspondendo a uma média de 14 amostras por dia de coleta.  A escolha dos pontos a serem amostrados era feita de forma aleatória sobre toda massa do lodo e, para cada ponto selecionado, retirava-se com uma pá aproximadamente 15 cm da massa superficial endurecida de lodo, num raio de aproximadamente 15 cm. A temperatura do lodo e a temperatura ambiente também eram medidas, e o procedimento para a extração da amostra ocorria a partir desta massa retirada e era idêntico ao realizado para o lodo após centrifugação, usando-se inclusive os mesmos cilindros de aço inox. A determinação do teor de sólidos totais, para cada conjunto de amostras, foi realizada de forma semelhante aos casos anteriores.

 

Medidas da Densidade Aparente

A densidade aparente, para um determinado teor de sólidos, foi obtida utilizando-se a densidade do lodo (úmido) para este mesmo teor de sólidos, conforme equação (3).

 

Medidas da Porosidade Total

A porosidade total, para um determinado teor de sólidos, foi obtida utilizando-se a densidade aparente para este mesmo teor de sólidos e a densidade de partículas, considerada invariante neste experimento (equação (8)).

 

Medidas da Densidade de Partículas

A medida da densidade de partículas, necessária para a obtenção da porosidade total do lodo, foi determinada para cinco amostras de lodo, em que se fez uso normal de polímero para a centrifugação, e para outras cinco amostras, onde não se utilizou polímero para a centrifugação. As amostras eram secas em estufa (a 105 °C) até atingirem massa constante e, após terem sido degranuladas e passadas em peneiras de 2 mm, uma quantidade de aproximadamente 10 g era introduzida em um balão volumétrico de 50 ml. O volume desta massa sólida era obtido através da medida do volume de álcool etílico (99,8%), necessário para completar a capacidade do balão volumétrico. Durante a introdução de álcool, o balão era agitado cuidadosamente, para eliminar as bolhas de ar que se formavam. A metodologia utilizada para esta medida foi baseada na metodologia Densidade de Partículas, Método do Balão Volumétrico (EMBRAPA, 1997).

 

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram determinados os intervalos de confiança para as médias populacionais da densidade do lodo líquido, do lodo após centrifugação e do lodo sólido, sendo que para este último foram construídos intervalos de confiança para cada um dos dias de coleta. Embora tenham se coletado amostras, tanto para o lodo líquido como para o lodo após centrifugação, em quatro dias distintos, os valores das densidades e teores de sólidos estiveram bem próximos nestes dias e, desta forma, os intervalos de confiança foram construídos com a totalidade das amostras, para cada um destes lodos. As distribuições populacionais das densidades foram consideradas normais e, como o número de amostras foi pequeno, utilizou-se a distribuição t de Student para a construção destes intervalos (CHASE e BOWN, 1986; HOEL, 1981). Os intervalos de confiança foram calculados através da expressão (13), onde representa o número de amostras, e   correspondem, respectivamente, à média e ao desvio padrão amostrais para a densidade, à variável da distribuição t de Student para o nível de significância , e à média populacional. Como o nível de significância escolhido foi , a probabilidade dos intervalos conterem a média é de 95%.

 

(13)

A Tabela 1 fornece, para cada tipo de lodo, o número de amostras coletadas , a densidade média ( ), o desvio padrão da média , o valor   e o percentual deste valor sobre o valor da média, os intervalos de confiança para as densidades, os teores de sólido médios correspondentes, e as temperaturas médias destes lodos (TL).

Pode-se notar pela Tabela 1 que quanto menor o número de amostras, maior é o desvio padrão da média das medidas de densidade e maior é o intervalo de confiança. Nas duas primeiras amostragens do lodo sólido, foram feitas em torno de 10 medidas e nas amostragens seguintes, em torno de 15 medidas, que ainda é um número muito pequeno. Além disso, deve-se levar em conta que o lodo sólido possui uma distribuição de massa mais heterogênea que o lodo líquido e o lodo após centrifugação. Como consequência, o desvio padrão da média é bem maior para o lodo sólido, quando comparado com os valores do lodo líquido e após centrifugação.

A Tabela 1 mostra que o intervalo de confiança para o lodo sólido de 10/04 corresponde a quase 10% da respectiva densidade média, que é um valor muito alto. Aumentar suficientemente o número de amostras, a fim de reduzir o intervalo de confiança, seria uma boa alternativa, mas poderia consumir muito rapidamente a massa de lodo disponível para as análises, uma vez que se pretendia analisar o lodo sólido por pelo menos quatro meses, que normalmente é o tempo que o lodo sólido fica disposto no pátio de cura e secagem.

Tabela 1. Intervalos de confiança para a média populacional da densidade dos lodos líquido, após centrifugação e sólido.

 

Lodo

 

 

 

(kg/m3)

 

(% sobre dens. média)

 

Intervalos de confiança para a densidade

 

Teor sol. médio

(%)

 

TL

 

(°C)

Líquido

42

996,9

1,0

2,2

(0,2%)

1,4

18,5

Após centrifugação

34

1065,1

3,6

7,4

(0,7%)

23,0

23,1

Sólido
23/02/2010

10

1029,3

10,5

23,7

(2,3%)

24,8

24,1

Sólido
13/03/2010

09

1078,3

18,8

43,5

(4,0%)

31,0

24,8

Sólido
26/03/2010

16

1070,2

9,3

19,8

(1,9%)

27,0

25,7

Sólido
10/04/2010

15

1084,7

25,0

53,5

(4,9%)

28,7

21,2

Sólido
08/05/2010

15

1009,1

16,0

34,3

(3,4%)

32,3

22,0

Sólido

12/06/2010

15

1024,4

16,3

35,0

(3,4%)

33,0

16,1

Sólido
29/07/2010

15

1016,9

19,7

42,3

(4,2%)

33,8

18,5

Sólido
04/09/2010

15

988,3

17,9

38,4
(3,9%)

35,4

20,7

 

A Figura 1 mostra a curva da densidade do lodo úmido em função do teor de sólidos, ajustada para todos os pontos experimentais do lote 1 (lodo líquido e após centrifugação) e lote 2 (lodo sólido).

 
Figura 1: Gráfico da Densidade do lodo úmido versus teor de sólidos.  
  

Durante as amostragens dos lodos líquido e após centrifugação (lote 1) e do lodo sólido (lote 2), algumas amostras de lodo foram tomadas, com o intuito de se medir o teor de sólidos fixos e voláteis com relação aos sólidos totais. Os resultados destas análises mostram que tanto para os sólidos fixos quanto para os sólidos voláteis, os valores estiveram bem próximos, para cada um destes lodos, resultando em valores em torno de 44% e 56%, respectivamente.

Embora a massa de lodo contida no lote 2 não tenha provindo do lote1, os lodos destes lotes são originários da mesma fonte de esgotos, receberam o mesmo tipo de tratamento, são uma mistura de descartes de lodos com idades próximas, e tem teor de sólidos fixos e voláteis muito próximos. Isto nos permite fazer um único gráfico com os pontos referentes aos lotes 1 e 2 e analisar o comportamento da densidade de uma forma indiferenciada.

A curva da densidade em função do teor de sólidos (Figura 1) mostra que o desaguamento mecânico foi decisivo na extração da umidade do lodo estudado, ou seja, a redução na umidade do lodo sólido (redução de 11%), nestes seis meses de disposição no pátio, foi a metade que o obtido pela centrifugação (redução de 22%). Isto se deve às circunstâncias de disposição do lodo no pátio (lodo não caleado e sem revolvimento) e também às condições climáticas (umidade e frio) neste período. A partir dos valores de descarte, a densidade, que estava em torno de 997 kg/m3, para um teor de sólidos próximo a 1,4%, começa crescer, atingindo o valor máximo de aproximadamente 1076 kg/m3, para o teor de sólidos de 27%; a partir dai, a densidade decai rapidamente. O último valor experimental obtido, 988 kg/m3, ocorre quando o teor de sólidos está próximo de 35%.

 As variações do teor de sólidos foram pequenas para o lodo sólido, a despeito do longo tempo que o mesmo ficou exposto no pátio. Para as quatro últimas análises, que tomaram um pouco mais da metade do tempo de exposição no pátio, estas variações foram ainda menores, o que nos obrigou a encerrar as medições, devido à falta de disponibilidade de espaço na ETE. Como consequência, isto nos impediu de conhecer valores experimentais da densidade para teores de sólidos maiores que 35%. Observações semelhantes a estas podem ser estendidas às curvas da densidade aparente e porosidade total em função do teor de sólidos (Figuras 2(a) e 2(b)). Estas curvas possuem um comportamento muito próximo do linear e devem convergir para valores constantes, quando o volume do lodo pára de contrair e fica constante. Isto deve ocorrer próximo ao ponto que a densidade começa decair e, portanto, próximo ao ponto de máximo (27%). As Figuras 2(a) e (b) podem estar indicando uma estabilização destes valores (densidade aparente e porosidade total, respectivamente), próximo a este ponto.

A Figura 2(a) fornece a curva da densidade aparente e a Figura 2(b) a curva da porosidade total, ambas em função do teor de sólidos, para todos os pontos experimentais do lote 1 (lodo líquido e após centrifugação) e lote 2 (lodo sólido).

 
 Figura 2: (a) Gráfico da Densidade Aparente versus teor de sólidos. (b) Gráfico da Porosidade versus teor de sólidos.
 

Quando o volume do lodo pára de contrair e fica constante, o lodo deixa de ser saturado, entrando ar nas amostras, o que provoca decréscimo no valor da densidade e estabilização nos valores da densidade aparente e porosidade total. A Figura (3) mostra a curva de saturação (razão entre a fração volumétrica de água QUOTE  e a porosidade total ) do lodo, em função do teor de sólidos. Através desta curvas, pode-se observar que até ser atingido o valor máximo da densidade do lodo úmido (teor de sólidos próximo à 27%), o grau de saturação reduz lentamente e após ser atingido este valor máximo, que deve estar associado ao limite de contração do lodo em processo de secagem, e conseqüente formação de fissuras e trincas, o grau de saturação passa a diminuir de forma acelerada com o aumento do teor de sólidos.

 
 Figura 3: Curva de Saturação do Lodo versus teor de sólidos.

 Para a determinação da porosidade total do lodo após centrifugação e do lodo sólido, utilizou-se a densidade de partículas obtida para o lodo com polímero, que foi de 1740 ± 37 kg/m3 e para o lodo líquido, utilizou-se o valor obtido sem polímero 1578 ± 15 kg/m3, uma vez que este é o único lodo que não tem polímero.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos para os intervalos de confiança (Tabela 1) mostram que alguns intervalos para o lodo sólido chegam a quase 10% dos valores médios amostrais correspondentes. Os intervalos de confiança poderiam ser reduzidos, aumentando-se o número de amostras, principalmente para o lodo sólido, que possui uma distribuição mais heterogênea de massa que os outros lodos.  Porém, isto demandaria maior quantidade de lodo a ser analisado e, consequentemente, maior área disponível para o experimento, o que nem sempre é viável numa ETE.

A curva da densidade em função do teor de sólidos (Figura 1) mostra que o desaguamento mecânico foi decisivo na extração da umidade do lodo estudado, ou seja, a redução na umidade do lodo sólido, nestes seis meses de disposição no pátio, foi a metade do obtido pela centrifugação. Isto se deve às circunstâncias de disposição do lodo no pátio (lodo não caleado e sem revolvimento) e também às condições climáticas (umidade e frio) neste período. Embora o comportamento da curva da densidade esteja de acordo com o esperado, as variações de teor de sólidos foram pequenas para o lodo sólido, a despeito do longo tempo que o mesmo ficou exposto no pátio. Como consequência, isto nos impediu de conhecer valores experimentais da densidade para teores de sólidos maiores que 35%. Observações semelhantes a estas podem ser estendidas às curvas da densidade aparente e porosidade total em função do teor de sólidos (Figuras 2(a) e 2(b)).

Muito embora os lodos dos lotes 1 e 2 sejam provindos da mesma fonte de esgotos, tenham recebido o mesmo tipo de tratamento, sejam uma mistura de descartes de lodos com idades próximas, e tenham teor de sólidos fixos e voláteis muito próximos, o ideal seria ter realizado todas as medidas com o lodo provindo de um mesmo lote.

A despeito das limitações citadas anteriormente, todas as metodologias experimentais foram aplicadas satisfatoriamente, podendo ser reproduzidas em condições climáticas diferentes das estudadas, com o lodo caleado ou não, revolvido ou não.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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10. PREVEDELLO C. L. Física do Solo. Curitiba. 1996.

11. SPERLING M. V.; GONÇALVES R. F. Lodo de esgotos: características e produção. In: Lodo de esgotos: tratamento e disposição final. DESA-UFMD-SANE

 

RESUMO

O conhecimento do volume ou massa do lodo, para o dimensionamento das etapas de tratamento e disposição final do lodo e para a obtenção dos custos de manuseio e transporte do mesmo, é fundamental para a gestão de uma ETE. Entretanto, para que se relacione volume e massa de lodo, para um determinado teor de sólidos totais, é necessário conhecer a densidade do mesmo para este teor de sólidos. Neste sentido, o presente trabalho buscou implementar metodologias para medidas experimentais da densidade do lodo proveniente de tratamento biológico por reatores UASB e sujeito ao desaguamento mecânico através de centrífuga. Como consequência, foram obtidas curvas da densidade do lodo úmido, da densidade aparente e da porosidade total, todas em função do teor de sólidos totais do lodo, cujas medidas foram tomadas durante o descarte, durante a centrifugação e durante seis meses no pátio de cura e secagem. Medidas da densidade de partículas também foram realizadas, afim de que se pudesse determinar a porosidade total do lodo para os diversos teores de sólidos analisados. Embora as medições tenham sido efetuadas com dois lotes de lodo ao invés de um e a secagem do lodo no pátio de cura e secagem tenha sido pouco eficiente, os resultados encontrados estão dentro do esperado. Todas as metodologias experimentais foram aplicadas satisfatoriamente, podendo ser reproduzidas em condições climáticas diferentes das estudadas, com o lodo caleado ou não, revolvido ou não.

PALAVRAS-CHAVE: gestão de uma ETE, densidade do lodo, porosidade do lodo, metodologias experimentais.

* Trabalho publicado originalmente nos anais do VII Simpósio Interamericano de Biossólidos, realizado de 26 a 28 de outubro de 2010, no Instituto Agronômico, Campinas-SP


Sara Rachel Orsi Moretto

Bacharel em Física pela PUC-SP. Mestre em Eletrônica e Telecomunicações/Materiais pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Professora Adjunta da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
Contato:
rachel@utfpr.edu.br

 

Rogerio Francisco Küster Puppi

Engenheiro Civil pela Universidade Federal do Paraná.  Mestre em Geotecnia pela PUC Rio. Doutor em Métodos Numéricos pela Universidade Federal do Paraná. Professor Adjunto da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.  

 

Eduardo Sabino Pegorini

Engenheiro agrônomo pela Universidade Federal do Paraná.  Mestre em Ciência do Solo/Recursos Naturais. Coordenador Industrial da Unidade de Tratamento de Esgoto da Região Metropolitana de Curitiba da Companhia de Saneamento do Paraná.

 

Pamila Sayuri Inoue

Graduada em Tecnologia em Química Ambiental pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná.

 

Guilherme Girardeli de Oliveira

Graduando em Tecnologia em Química Ambiental pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná. 



Reprodução autorizada desde que citado a autoria e a fonte


Dados para citação bibliográfica(ABNT):

MORETTO, S.R.O.; PUPPI, R.F.K.; PEGORINI, E.S.; INOUE, P.S.; OLIVEIRA, G.G. de Medidas da densidade do lodo proveniente de digestão anaeróbia. 2011. Artigo em Hypertexto. Disponível em: <http://www.infobibos.com/Artigos/2011_1/DensidadeLodo/index.htm>. Acesso em:


Publicado no Infobibos em 05/04/2011